Em ‘O Desabafo de Uma Mãe’, moradora de Nilópolis relembra a luta para livrar a filha da prisão
Rio – O fato de nunca ter sentado em um banco escolar não impediu a aposentada Valdicea França, de 65 anos e moradora de Nilópolis, de aprender as letras no teclado do computador e digitar um livro. O tema: a luta para provar a inocência da filha, Mirian França, presa por 15 dias em 2015 acusada de participação no assassinato da italiana Gaia Molinari.
Intitulado ‘O Desabafo de Uma Mãe’, o livro está disponível no Perse, um portal de autores independentes. Em 164 páginas, Valdicea França conta como a Polícia Civil do Ceará isolou sua filha dela e dos advogados, discorre a respeito das perguntas sem fundamento dos investigadores, como “por que uma mulher viajava sozinha?”, e volta a apontar a prisão como um caso de racismo.
“Minha filha foi presa por ser negra. De testemunha, ela passou a principal suspeita, sem provas”, relembra. As declarações de Valdicea na época do crime mobilizaram a imprensa, movimentos sociais e o Judiciário, que concedeu habeas corpus para Mirian, que não é considerada mais suspeita.
Passados três anos, a morte da turista italiana cujo corpo foi encontrado com marcas de violência no Natal de 2014 em Jericoacoara, no Ceará, continua um mistério. Por conta da falta de solução, a investigação foi reaberta há dois meses na tentativa de se chegar à autoria do homicídio. Dez pessoas já foram ouvidas e as provas colhidas no local do crime estão passando por nova perícia.
Mirian, que viajava com Gaia, cumpriu prisão temporária por contradições em seus depoimentos, mas não foi indiciada. Na época, ela era doutoranda do Instituto de Microbiologia da UFRJ e passava férias sozinha na região. “Ela chegou a me convidar para viajar. Mas eu tinha medo de avião. Quando soube da prisão dela, juntei R$ 1.500, era tudo o que eu tinha. Comprei a passagem e fui direto para a delegacia”, relembra Valdicea França.
A vontade de escrever surgiu como uma forma de tratamento para amenizar a dor de ter visto a filha presa. “Minha psicóloga dizia que eu tinha que tirar aquela dor. Passar por cima. Meus familiares também. Então, quando eu ficava triste, tentava escrever. O Word (programa de computador) ajudou muito, né? Ele corrige as palavras. Assim, fui aprendendo”, conta.
Procurada, a Polícia Civil do Ceará não deu retorno sobre o caso.