Assim é a ‘sopa de plástico’ que asfixia o mundo

Um novo estudo destaca que esse lixo, presente em terra, mar e ar, “nos perseguirá durante séculos”

Um grupo de cidadãos retira plásticos de um rio nas Filipinas
Um grupo de cidadãos retira plásticos de um rio nas Filipinas MARIA ANTONIA N. TANCHULING

ISABEL FERRER – EL PAÍS

Plastiglomerado. Esse é o nome oficial de um novo mineral que não existia antes na natureza, mas agora se tornou frequente. Foi descoberto em 2014, na praia de Kamilo, da ilha do Havaí, e é formado por sedimentos e detritos plásticos. Na era atual, dominada pela ação dos seres humanos, “os perigos decorrentes da produção e uso indiscriminado deste material sintético, derivado da indústria petroquímica, nos perseguirão durante séculos”, diz o cientista político holandês Michiel Roscam Abbing, autor do recém-publicado Atlas da Sopa de Plástico do Mundo, cujo primeiro exemplar foi entregue a Karmenu Vella, comissário (ministro) europeu do Meio Ambiente. A obra diz que só um tratado internacional poderá conter um produto hoje inseparável do nosso cotidiano.

“Os oceanos cobrem 71% da superfície da Terra, e existe a crença errônea de que só há ilhas de plástico flutuando por aí (…), quando o certo é que ele está por toda parte: em terra, mar e ar. Sua acumulação e fragmentação são tamanhas que os danos derivados do plástico superam seus benefícios”, afirma Roscam Abbing. Especialista em meio ambiente e membro da Fundação Sopa de Plástico (Amsterdã), ele cita um exemplo visual para ilustrar uma luta que é de todos – produtores, Governos e consumidores. É a famosa imagem do cavalo-marinho com a cauda enroscada em um cotonete, que delata a responsabilidade mal compartilhada. Foi feita pelo fotógrafo Justin Hoffman, morador do Canadá, enquanto mergulhava na Indonésia, e aparece entre as ilustrações do Atlas. “Poderia ter sido evitado”, diz o escritor. “Os cotonetes plásticos vão para a privada e então diretamente para as águas superficiais e as praias. Sendo que o fabricante poderia fazê-los de cartolina ou madeira. Mas são mais caros.”

Um albatroz com o estômago cheio de plástico
Um albatroz com o estômago cheio de plásticoCHRIS JORDAN
No texto, mostra-se que numa praia qualquer do Reino Unido há em média 24 cotonetes a cada 100 metros. Outros dados: nos Estados Unidos, são jogadas no lixo 2,5 milhões de garrafas de plástico por hora; a cada minuto, usa-se no mundo um milhão de sacolas desse material. E, o pior de tudo, na sua opinião: as embalagens pequenas, fabricadas com diversos tipos de plástico, e usadas uma só vez. “Nos países em desenvolvimento a publicidade do xampu costuma ser assim, porque as pessoas têm uma poder aquisitivo diferente. Acumulam-se em grandes quantidades, e poderia ser incentivado outro tipo de fabricação e um consumo mais responsável, por parte da própria empresa, com embalagens reutilizáveis”. Quanto ao pão, “perdeu-se o costume de levar as tradicionais sacolas de tecido, e são colocados em bolsas de plástico, destinadas ao lixo”, acrescenta.

Uma boa ideia para reduzir a fabricação e uso dos plásticos é a tatuagem a laser na casca de frutas e verduras. “É seguro e sustentável, mantém a etiquetagem obrigatória e foi aprovada pela União Europeia. A Espanha é pioneira nessa tecnologia (Laserfood, de Valência) e economiza pacotes porque a informação essencial é impressa na casca.” Com fotos dessa poluição em lavouras, no fundo dos mares, em redes pluviais e qualquer outro meio ou superfície imaginável, o Atlas recorda que todos os plásticos se degradam. Suas partículas, impossíveis de recolher, são ingeridas por humanos e animais. “Um perigo enorme: entram em organismos vivos e ignoramos seus efeitos”. De qualquer forma, embora a produção responsável, o manejo sustentável de terras e águas e a reciclagem e a cooperação entre o setor público e privado sejam essenciais, a sopa de plástico supera as barreiras nacionais. E há uma lacuna jurídica. “Nada menos que a falta de um tratado internacional no âmbito das Nações Unidas dedicado a conter a própria sopa”, é o conselho que fecha o Atlas.

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