Placar da votação dificulta Reforma da Previdência

O Globo

Mercado financeiro e analistas esperavam a vitória do presidente Michel Temer no plenário da Câmara, nesta quarta-feira, na apreciação da denúncia de corrupção passiva feita contra ele pela Procuradoria Geral da República (PGR). Porém, o número de votos obtidos pelo governo, 263, ficou aquém do esperado. Isso porque, além de maioria simples apertada, o placar ficou muito aquém dos 308 votos necessários à aprovação de uma reforma constitucional como a da Previdência. É possível para o Palácio do Planalto chegar lá, avaliam especialistas. Mas a margem de manobra é pequena e pode ser que o governo consiga emplacar no máximo a idade mínima de 65 anos, tema ao redor do qual parece haver consenso.

Analistas chamavam a atenção no início de quarta-feira – quando o mercado abriu tímido, sem demonstrações de otimismo excesso tanto na Bolsa quanto no câmbio – para o fato de que o placar sozinho não sepultava a reforma da Previdência. Foram 21 deputados da base ausentes ou que optaram pela abstenção na votação. Além disso, foram 21 os tucanos contrários a Temer, mas partidários da agenda reformista tocada pelo presidente. Ou seja: o número de votos para a aprovação de mudanças nas regras da aposentadoria, mesmo que mais acanhadas que a proposta original, pode crescer e se aproximar dos 308 necessários.

“Hoje vemos um movimento de realização (de lucros) na Bolsa, mas a manutenção de Temer (na Presidência) é favorável. Há um otimismo com a recuperação econômica, que deve começar a ganhar força com o efeito da queda dos juros na economia. Um impulso maior vem da aprovação de uma reforma. O número ficou um pouco abaixo do esperado. No entanto, para a votação de uma reforma, talvez o governo consiga mais”, avaliou Rogério Freitas, sócio-diretor da Florença Investimentos.

A Bolsa operou em leve queda esta manhã, após ter subido quase 1% na quarta-feira na expectativa da vitória do governo na Câmara dos Deputados. Os investidores aproveitam para embolsar os ganhos dos últimos pregões. Ontem, o Ibovespa fechou acima dos 67 mil pontos, o que não acontecia desde a delação dos executivos da JBS, em meados de maio.

Alguns economistas, porém, acham difícil que a Reforma da Previdência saia até o ano que vem.

“Será complicado votar a Reforma da Previdência tão próximo da eleição. Acho que o governo terá que fazer o que tem feito: aumentar imposto e revisar a meta de déficit. A reforma fica para 2019”, observa Sergio Vale, da MB Associados, que acredita que a Reforma Tributária teria mais chance de ser aprovada antes da Previdência, tese com a qual concorda o núcleo duro do Palácio do Planalto.

Para Vale, é quase impossível imaginar que num ano eleitoral, quando o Senado vai trocar dois terços de seus membros, seja viável votar uma reforma tão impopular. O economista acredita que o governo conseguirá avançar na agenda de reformas microeconômicas, com a troca da TJLP pela TLP e a nova Lei de Falências, o que será positivo para as empresas.

“Na macroeconomia, será ajustar o curto prazo, com um aumento da meta fiscal, mas não há muita chance para reformas de fôlego”, disse.

Se o caminho para os 308 votos terá que ser construído, Ricardo Gomes da Silva, superintendente da Correparti Corretora de Câmbio, pondera que a votação mostrou que Temer tem força política:

O placar favorável ao presidente Temer amplia a possibilidade de que as próximas denúncias da PGR também sejam barradas na Câmara, impactando de maneira favorável à governabilidade e assim permitir ao presidente que possa avançar nas reformas estruturais do país.

Mas com as denúncias de corrupção contra o presidente, o estrategista do banco Mizuho no Brasil, Luciano Rostagno, avalia que é mais provável a aprovação e uma Reforma da Previdência mais para um próximo governo, em 2019. Mesmo a aprovação da idade mínima, de 65 anos, ele vê como improvável.

“A votação de 263 votos não garante capital político ao governo para levar adiante a reforma da Previdência. E atrapalha muito a impopularidade do presidente Temer junto à população”, disse o estrategista do Mizuho.

Segundo Rostagno, a euforia do mercado acaba sendo impulsionada pela vasta liquidez existente no exterior, atraindo recursos para ativos de risco. Não é necessariamente uma leitura acurada do cenário político brasileiro.

“Na minha avaliação, é o cenário externo que está deixando o mercado financeiro tão paciente. Quando esse ambiente de muita liquidez acabar, isso pode se alterar e o Brasil deve sair do portfólio de investimento por conta de sua situação fiscal ruim”, disse Rostagno.

No cenário econômico projetado pela consultoria Tendências ainda existe espaço para a aprovação da Reforma da Previdência. Mas o economista Fabio Klein observa que, mesmo que seja aprovada, isso não exime o governo do ajuste de outros gastos. Klein lembra que as despesas da Previdência, considerando apenas o setor privado, crescem 5% ao ano em termos reais. A proposta original da reforma derrubaria esse crescimento para 2,5% ao ano.

“Com uma reforma que tenha 60% da proposta original (baseada na idade mínima), o crescimento dos gastos com o INSS crescerão 3,5% ao ano. Ou seja, não há reforma que impeça o crescimento dos gastos com aposentadorias”, afirma.

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