Biografia explora os anos de luta de Francisco Julião

Escritor lança no Recife biografia de Francisco Julião, o “agitador” que liderou as Ligas Camponesas e deu visibilidade aos homens do campo

Julião com Josué de Castro durante desapropriação do Engenho Galiléia (1959). Foto: Arquivo DP/D.APress
Julião com Josué de Castro durante desapropriação do Engenho Galiléia (1959). Foto: Arquivo DP/D.APress

Por Vandeck Santiago – Diario de Pernambuco

Houve um breve momento na história – entre o final dos anos 1950 e início dos anos 1960 – em que Francisco Julião foi o homem mais discutido do Brasil. Seu nome aparecia com frequência na imprensa nacional e internacional, sempre acompanhado da definição de “agitador”. O Diario de Pernambuco publicou uma piada na época em que dois homens estão na praia quando um deles afirma: “Julião deve estar aqui tomando banho”. O outro pergunta: “Como é que você sabe?”. Aí o primeiro responde: “Veja como o mar está agitado…”

A movimentação de Julião era tema de conversa também na Casa Branca: em 1962 o governador do Rio Grande do Norte, Aluízio Alves, teve encontro lá com o presidente John Kennedy para tratar da Aliança para o Progresso, programa criado pelos EUA para combater a expansão do comunismo na América Latina e no qual o Nordeste era uma das prioridades. A certa altura do encontro, Kennedy pergunta para Aluízio Alves: “E como está o movimento de Julião?”.

Julião alcançara a notoriedade como líder das Ligas Camponesas, movimento surgido em 1955. A partir de sua atuação, pela primeira vez na história os camponeses conquistaram visibilidade política e social e viram reivindicações serem incorporadas na agenda política nacional e internacional (reforma agrária era um dos pontos de destaque do programa da Aliança para o Progresso). Com o golpe militar-civil de 1964, as Ligas foram imediatamente extintas, e Julião cassado e preso. Libertado em 1965, exilou-se no México.

No exílio, começou a virar um fantasma para a História. Retornou ao Brasil em 1979, Disputou uma eleição sem sucesso (para deputado federal, por Pernambuco, em 1986). Seguiu novamente para o México. Mais uma vez, retornou ao Brasil, em 1992, como dirigente do PDT e assessor do governador eleito do Rio, Leonel Brizola (de quem foi amigo). A liderança e a notoriedade, porém, já haviam ficado para trás. Em 1997, rumou para o México pela última vez: morreu em 1999, de infarto, em Tepoztlán, aos 84 anos. Pobre e esquecido.

O resgate da história dele começou em 2001, quando a Assembleia Legislativa de Pernambuco publicou em livro 22 perfis biográficos de deputados estaduais – entre eles, Francisco Julião. Desde então, houve uma série de eventos, reportagens e pesquisas sobre Julião. A principal obra sobre o tema será lançada amanhã no Recife, pela Editora Civilização Brasileira (RJ): Francisco Julião – uma biografia, de Cláudio Aguiar, presidente do PEN Clube do Brasil e autor de Caldeirão (romance, 1982) e de duas dezenas de outras obras nos gêneros teatro e ensaio. Aos 18 anos (em 1962) ele começou a trabalhar como repórter do A Liga, jornal das Ligas Camponesas.

Francisco Julião é fruto de trabalho de cerca de dez anos, entre pesquisa e redação. Cláudio vasculhou documentos e arquivos, no Brasil e no México, e entrevistou pessoas que conviveram política e pessoalmente com Julião. Montou uma obra de 854 páginas que recupera toda a trajetória do líder radical. Livro indispensável para o conhecimento do Brasil pré e pós-golpe de 1964.

Entrevista >> Cláudio Aguiar

“Não me preocupei em fazer um livro para agradar a esquerda nem para irritar a direita.”

Tendo sido tão próximo a Julião, o senhor fez uma biografia engajada ou procurou ser objetivo?

Não me preocupei em fazer um livro para agradar a esquerda nem para irritar a direita. Alguém já disse que essa biografia não é contra nem a favor do biografado. O fato de estar próximo do tema e do personagem facilita a compreensão de todo o processo, mas o autor precisa estar vigilante para evitar distorções provocadas pela proximidade.

Há autores que associam Julião à iniciativa de luta armada empreendida por grupos das Ligas, durante o governo João Goulart. O que o senhor diz disso?
Esses atos de luta armada foram feitos à revelia dele. Julião não teve nenhuma responsabilidade sobre essas ações.

Como o senhor definiria Julião, do ponto de vista ideológico e político?
Ele foi um socialista utópico, um agitador social e um político dedicado a uma causa, a dos camponeses.

Serviço
Lançamento de Francisco Julião – uma biografia
Onde: Livraria Cultura (Paço Alfândega, Bairro do Recife)
Quando: Quarta-feira (16), às 18h
Preço: R$ 75

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