Estrategistas, por Luis Fernando Veríssimo

 

Uma improvável guerra entre Coreia do Norte e Estados Unidos não será a primeira. Em 1950 a Coreia do Norte cruzou o Paralelo 38, que separava as duas Coreias desde o fim da Segunda Guerra Mundial, e invadiu o Sul. As Nações Unidas autorizaram uma intervenção de forças aliadas para conter a invasão.

As “forças” eram quase 100% americanas, comandadas pelo folclórico general Douglas MacArthur (foto), que tinha se destacado, no Pacífico, como um dos generais-celebridades da Segunda Guerra, junto com Patton, na Europa, e Montgomery e Rommel, no Norte da África.

No fim da guerra MacArthur fora instalado pelo presidente americano Truman como vice-rei do Japão, onde, entre outras coisas, instituiu uma reforma agrária de fazer o Stédile salivar, e comandou suas tropas na Coreia sem sair de Tóquio.

A Guerra da Coreia também revelou um estrategista militar de primeira ordem: eu. As coisas não iam bem para os coreanos do Sul e os americanos, encurralados na ponta extrema da península.

Apesar da pouca idade eu me interessava pela guerra. Estudei meus mapas e conclui que uma maneira de romper o sítio seria fazer um desembarque anfíbio como os que os americanos tinham feito em ilhas japonesas e, com tropas aliadas, nas praias da Normandia durante a Segundona, atrás das linhas inimigas.

Cheguei a escolher o lugar do desembarque: Inchon, na costa leste. E foi exatamente onde ocorreu o ataque, dias depois. Não concluí que meu plano havia sido recebido telepaticamente pelo MacArthur, que não tinha pensado nisso. Minha megalomania não chegava a tanto. Mas, coincidência ou não, a estratégia deu certo. O Sul rompeu o cerco e perseguiu o Norte para além do Paralelo 38, até a fronteira com a China.

 

Foto: Corbis

 

Douglas MacArthur (por falar em megalomania) foi o mais perto que um moderno general americano chegou de ser golpista. Com a aproximação dos americanos da sua fronteira, os chineses tinham entrado na guerra, e a grande questão do momento era se os americanos deveriam ou não atacar o outro lado do Rio Yalu, que marcava a fronteira entre Coreia e China.

MacArthur queria não apenas levar a guerra para o território chinês como usar armas nucleares. Sua insubordinação — negou-se a ir a Washington falar com o presidente sobre o que fazer com os chineses, tiveram que marcar a reunião num local escolhido por ele — levou Truman a destituí-lo do comando.

MacArthur voltou para casa como ídolo da direita dura americana. É difícil imaginar que liderasse um movimento anticomunista sedicioso, mas se havia alguém com perfil e disposição para isto era ele. Preferiu despedir-se com um famoso discurso que terminava dizendo que os velhos soldados nunca morrem, apenas desaparecem lentamente. E começou a desaparecer.

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