Tem até cavalo no metrô do Recife

A passarela era de pedestres. Não é mais. Virou passagem de cavalos. De motos e de ladrões. Essa é a realidade de uma das dezenas de passagens que integram o metrô do Recife, o mesmo que levará turistas para a Copa das Confederações e para a Copa do Mundo de 2014. Nesta quinta-feira (28/02),  a reportagem do JC flagrou, entre motos e muita sujeira, um homem cavalgando livremente pela passarela externa da Estação Coqueiral do metrô, uma das mais importantes da Linha Centro, localizada na Zona Oeste do Recife. A cena chocou. Mas parecia corriqueira por lá. O cavaleiro seguiu em frente, sem demonstrar qualquer constrangimento. Parecia acostumado. Além do medo, passageiros, funcionários do metrô e pessoas que vivem no entorno de algumas das estações convivem com o absurdo sem surpreender-se. Acostumaram-se. E, com a retirada dos policiais ferroviários federais (PFFs), proibidos de atuar como policiais pela Polícia Federal de Pernambuco, o absurdo tende a tornar-se rotina.

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A presença do homem cavalgando chocou a reportagem, mas foi o que menos incomodou as pessoas que usavam a passarela externa no momento. O que as preocupava, de fato, eram os possíveis ladrões, que diariamente surpreendem os transeuntes, muitos deles usuários do metrô. “E agora tudo ficará pior, tenho certeza. Os policiais ferroviários não cuidavam apenas da parte interna do sistema. Ajudavam com a área externa, impunham presença. Só o fato de estacionarem as motos e viaturas nas redondezas da estação já ajudava. Cuidavam da passarela também. Não era só dentro do sistema. Sofremos muito. Os assaltos no entorno são constantes, motos passam a qualquer instante e não temos nenhuma proteção. Isso nos afeta também porque precisamos chegar ao metrô”, desabafou um assustado funcionário do metrô, sem se identificar.

A população confirma o que diz o funcionário. “É tudo sujo, pixado, cheio de urina e fezes. Mas temos que nos arriscar. O metrô tenta melhorar, mas os ladrões quebraram tudo, inclusive as lâmpadas, para facilitar os assaltos”, diz a dona de casa Josineide Maria Mendes, que usa a passagem todos os dias para levar o filho à escola.

A CBTU se defendeu. Por meio da assessoria de imprensa reafirmou o discurso histórico: que a passarela de Coqueiral é externa à estação, foi construída apenas para facilitar a passagem dos moradores das comunidades que cercam a linha férrea e não é de responsabilidade da companhia, que garante a segurança e integridade da passagem que existe internamente na estação. A segurança é dever do Estado. A Polícia Militar, por sua vez, afirmou que o policiamento na passarela sempre foi feito pelos policiais ferroviários. Que os PMs podem atuar na área no caso de ocorrências, mas que a responsabilidade é dos ferroviários.

No interior do sistema metroviário a situação é bem melhor. Ontem, seguranças privados circulavam pelas estações. Embora não tenham autorização para andar armados – usam apenas cassetetes -, ajudam a manter a ordem. “Acho muito errado proibir os ferroviários de usarem armas. Esses seguranças privados não têm força, principalmente em dia de jogo de futebol. Eles apenas assistem à desordem. Se os ladrões quiserem roubar, roubam e eles não têm como evitar”, afirmou a técnica em enfermagem Lilian Araújo, passageira diária do metrô. A CBTU informou ter dobrado o número de seguranças privados. Ontem, na Estação Coqueiral, pelo menos três deles faziam a segurança. Um reforço à Polícia Militar também teria sido solicitado pela superintendência da CBTU.

No que depender da Polícia Federal em Pernambuco, os policiais ferroviários federais (PFFs) não voltarão a trabalhar armados, nem usando roupas de polícia. Para os federais que comandaram a operação que resultou na prisão de 23 PFFs anteontem, a Polícia Ferroviária Federal ainda não existe. Ela está prevista na Constituição Federal e foi criada em lei, mas sem regulamentação. Portanto, não pode atuar como tal.
Durante coletiva na sede da PF no Recife para explicar os motivos das prisões, os delegados Eduardo Passos e Bernardo Gonçalves Torres foram enfáticos. “Não existe Polícia Ferroviária Federal, nem policiais ferroviários federais. Ela um dia vai existir, o processo está em tramitação, mas ainda não existe. Ela não é um órgão federal, não tem uma diretoria, nem uma corregedoria, nem pode ter um controle externo do Ministério Público. Os supostos PFFs na verdade são assistentes de segurança ferroviária”, afirmou o delegado Bernardo Gonçalves, que representou a Superintendência da PF na coletiva.

Além da ilegalidade de função, os federais explicaram que começaram a investigar os ferroviários no ano passado, depois que três denúncias de tortura contra usuários do metrô chegaram à PF. Três inquéritos foram abertos e já houve indiciamentos. Segundo os delegados, nos casos denunciados os policiais ferroviários teriam espancado e algemado as vítimas, atuando como se fossem policiais. Dos 23 ferroviários presos, 20 foram autuados pelo crime de porte ilegal de armas e três pelo crime de usurpação de função pública porque não estavam armados, apenas usando trajes da PFF.

Todos pagaram fiança no valor de um salário mínimo (R$ 678) e foram liberados na madrugada de ontem. As armas, de variados calibres, foram apreendidas. “Poderia acontecer, inclusive, uma eventual tragédia. Eles achavam que eram policiais, mas não são”, afirmou o delegado Eduardo Passos. Segundo o federal, a responsabilidade da CBTU também será apurada, já que os ferroviários atuavam com o aval da instituição, inclusive usando armas registradas por ela. Os ferroviários decidiram voltar às estações de trabalho, mas não vão trabalhar efetivamente. Sentem-se inseguros. Uma assembleia da categoria, que reunirá todos os metroviários, será realizada na próxima terça-feira, às 18h, na Estação Recife, para decidir por uma possível greve.

Fonte: Ne10

 

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