Por Luis Nassif
Está nas mãos da OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional do Rio de Janeiro) a oportunidade de fazer história, moralizando de vez o Quinto Constitucional.
O Quinto é a possibilidade das OABs, nacional e estaduais, indicarem um quinto dos integrantes em cargos vitalícios dos tribunais superiores. Em geral, é uma ação entre amigos. Em cada indicação, colocam-se quatro candidatos fantasmas e o candidato preferido da cúpula. E aí entram as influências dos grandes escritórios de advocacia.
Nas últimas indicações, a OAB do Rio procurou recuperar a tradição do Quinto, indicando advogados com obras reconhecidas. No caso da Justiça do Trabalho, indicou a advogada Sayonara Grillo Coutinho, com obra respeitável. Para o Tribunal de Justiça do Estado indicou o Defensor Público Alexandre Câmara, um dos maiores especialistas em direito de propriedade do solo.
Mas agora encontra-se em uma sinuca de bico, com a indicação da advogada Marianna Fux, filha do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF). Pela idade e pelo currículo, a indicação de Marianna será um desprestígio para a classe e para a causa de reabilitação do Quinto Constitucional.
Ocorre que existe uma legislação falha, para a indicação, mas que foi seguida no caso de Marianna.
Tempos atrás, a OAB nacional alterou as exigências de documentos mínimos para a candidatura do advogado ao Quinto. Deveria haver condições objetivas – como, por exemplo, idade mínima, dez anos de inscrição na Ordem, histórico de ações defendidas.
Mas não há. As exigências atuais são uma mistura de comprovações. Basta ter um número mínimo de petições ou consultorias ou advocacia consultiva. E os escritórios que enviam os certificados podem alegar que a consultoria é sigilosa para não serem obrigados a comprovar o trabalho que foi informado.
Além disso, há muita controvérsia sobre a quantidade de petições. Os criminalistas argumentam que uma grande ação criminal pode consumir mais que um ano e não pode ser comparada a ações menores.
A indicação de Marianna foi do escritório de Sérgio Bermudes – maior escritório de advocacia do país e conhecido pelo relacionamento estreito com autoridades do Judiciário. Bermudes mantém um apartamento enorme no Rio apenas para acolher convidados, que são buscados no aeroporto por seu motorista particular. Entre as visitas ilustres e frequentes, está o casal Gilmar Mendes (cuja esposa é sócia de Bermudes), a ex-Ministra do STF Ellen Gracie entre outros.
A indicação causou enorme mal-estar entre os advogados do Rio, mas não houve como recusar.
Para dar um mínimo de legitimidade à questão, o presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, adiou o processo, abriu um longo prazo para impugnação e decidiu transferir a decisão da diretoria para os 180 conselheiros da Ordem. Irá se exigir uma comprovação mais detalhada do currículo da advogada.
Ocorre que os votos são em aberto. E há o evidente constrangimento dos conselheiros – todos eles com bancas importantes e ações nos tribunais superiores – de se indispor com o poder articulado que bancou a indicação de Fux e banca a de Marianna.
A solução seria eleição direta. Teme-se que possa ser alvo de poder econômico, em função do enorme número de advogados do estado.
Bobagem! Apesar da grande quantidade, trata-se de um universo profissional restrito, ao alcance das informações e da fiscalização. Basta um regulamento rígido e um conselho de ética ativo para impedir exageros de campanha.
Mesmo que ocorra alguma deformação do processo, será imensamente menor do que as deformações atuais, que permitem a apenas um grande escritório de advocacia acumular tal poder, e a um Ministro do STF dar como presente à jovem filha um cargo vitalício em Tribunal superior.
É uma desmoralização. A herança dos pobres aos filhos é a educação; dos ricos, a propriedade; do Fux, um cargo vitalício no Tribunal.