Em um ano,Teresa Duere conseguiu imprimir um perfil a sua gestão no TCE
A quarta e última matéria em que a Folha de Pernambuco homenageia o pioneirismo da mulher pernambucana, a conselheira Teresa Duere fala sobre sua trajetória e conquistas. Conta do trabalho realizado junto a Dom Hélder. Fala de todo processo que a levou para a vida política. Elege a questão do gênero como uma de suas bases parlamentar e também mostra que seu pioneirismo começou muito antes de ser a primeira mulher presidente do Tribunal de Contas do Estado.
“Sou recifense, mas tenho ascendência árabe. O pai do meu pai era palestino e daí vem o nome. Meu pai foi comerciante e também político, chegando a ser deputado. Minha mãe cuidou da casa até o dia em que ela conheceu Dom Hélder, sendo voluntária nos trabalhos dele e, inclusive, presidiu o Banco da Providência por mais de 15 anos. Quando Dom Hélder faleceu e Dom José fechou o banco, ela afastou-se do trabalho social. Eu tive dois grandes aprendizados: um pai político e uma mãe comprometida com a justiça social.
Toda minha formação educacional foi em colégios religiosos (São José, Eucarístico e Vera Cruz). E foram muitos, porque em alguns não fui bem entendida, por ter uma energia muito forte. Fiz Serviço Social, Administração de Empresas e mestrado em Planejamento Urbano no Chile. Tudo para me preparar muito para as atividades que exerci posteriormente.
Quando adolescente, eu fui bandeirante. E tive a oportunidade de ter uma chefe que ajudou muito na minha formação de cidadã, que foi Zezita Cavalcanti. E foi ela que levou quatro bandeirantes para estagiar na Operação Esperança, que envolvia várias ações sociais. Logo depois, Dom Hélder ganhou um prêmio internacional e comprou três engenhos: Taquari, Ipiranga e Iguaretama. Ele comprou porque queria mostrar e provar que a reforma agrária era possível. Ele e Zezita me chamaram para implantar a reforma agrária no Engenho Ipiranga, no Cabo.
Em 1968, a realidade política do nosso Estado começou a apertar. Dom Hélder passou a ser considerado um comunista. Mas não podia ser tocado porque vivaria um mártir. Então eles começaram a pegar os auxiliares de Dom Hélder. Por duas vezes fui presa. Eles queriam a comprovação que Dom Hélder fazia guerrilha rural através dos engenhos, coisa que nunca existiu. Quando dois dos seus auxiliares desaparecem, ele recebeu um recado dizendo que outros teriam o mesmo fim. Dom Hélder achou melhor que eu e Zezita fôssemos embora. Zezita foi para o México, para Cuernavaca, onde trabalhou na área de educação com o grande pedagogo Iván Illich. E eu fui para o Chile trabalhar e estudar.
De volta ao Brasil, tive que ficar no Rio de Janeiro onde consegui reaver toda minha documentação, mas não podia voltar para o Recife. Um dia fui procurada por Gustavo Krause que me convidou para trabalhar no Projeto Um Por Todos, no qual a prefeitura dava o material e a comunidade entrava com a mão de obra para calçar as ruas. Em seguida, o governandor Roberto Magalhães me chamou para dirigir a COHAB e depois assumi a Secretaria Estadual de Habitação. Nessa época, Marcos Villaça assumiu a direção da Legião Brasileira de Assistência (LBA) e me convidou para assumir a superintendência em Pernambuco, mas um ano depois, ele me leva para a direção nacional em Brasília.
Quando terminei o trabalho na LBA voltei para Pernambuco e fui convidada a me candidatar a deputada estadual. Fui perguntar a Dom Hélder e a Zezita o que eles achavam, e ele disse: ‘Qualquer espaço que seja para poder servir, nós devemos abraçar. Então, minha filha, isso é missão, vá embora. O mais importante é sua consiência. Essa, sim, não pode ser tocada. Não pense em pequenas coisas. Olhe para as coisas importantes’. Foi assim que entrei para a política.
Foram três mandatos de deputada estadual. E em 160 anos de Assembleia, nenhuma mulher tinha assumido a liderança de um partido de oposição e eu assumi. Nessa época, recebi o Prêmio de Economia Leão do Norte, pela primeira vez atribuído a uma mulher. Posteriormente, recebi o título de comendadora da Ordem do Mérito dos Guararapes. Em seguida, também fui a primeira mulher a ser líder da bancada do então Governo Jarbas.
Durante meus mandatos, entre outras questões, eu fui a única palarmentar no Brasil a incluir a questão do gênero dentro das políticas públicas. E apresentei o seguinte projeto: quando uma família adquirir uma casa, que ela fique no nome da mulher, porque ela dá um valor maior a casa e não a vende. Outras intervenções minhas e que resultaram em ações concretas foram: a conquista das visitas conjugais para as mulheres do Bom Pastor; a instituição da Medalha Mulheres de Tejucupapo; a transformação da Casa de Passagem em utilidade pública, o que vem facilitar a obtenção de verbas.
Cheguei ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) por indicação da Assembleia, em 2002. Desde essa época passei por várias diretorias: Escola de Contas, Ouvidoria, Corregedoria e Vice-Presidência. Em 45 anos do TCE, é a primeira vez que uma mulher assume a presidência, isto eleita por unanimidade por seis conselheiros, e que muito me honra. Com um ano de gestão, já consegui imprimir um perfil a minha administração. O TCE hoje é uma instituição mais aberta à população e estamos promovendo várias ações preventivas. Ainda tenho mais um ano para sedimentar a proximidade do tribunal com a sociedade”.
Mensagem
“Sobretudo, a mulher tem que ser uma cidadã. Cabe a ela, fundamentalmente, a formação da sua família, a educação dos seus filhos. A mulher tem um papel muito importante, seja ela de que profissão for. Se ela for ‘do lar’ nem por isso ela é menos cidadã do que qualquer outra. Devemos ter a consciência de nosso processo, da vida política, da visão de humanidade, da construção de um mundo justo. É para isso que estamos construindo um novo espaço. Cada uma no seu papel é tão importante quanto a outra. Mas temos que construir essa consciência cidadã que é o que falta hoje nesse País”.
fonte:folhape