Temos um Senado sem consciência de sua responsabilidade para com o futuro, como se a política fosse apenas acordos – nem sempre lícitos – para manter as vantagens que os cargos oferecem
O Senado do Chile tem uma comissão que se dedica a pensar o futuro, sem compromisso com o dia a dia. Nela reúnem-se senadores e público em geral para imaginar as alternativas adiante e orientar o país na sintonia com os rumos do mundo.
Nos dias 17, 18 e 19 de janeiro, essa comissão organizou o II Congresso do Futuro, com 52 pensadores e políticos e um público de cerca de 300 pessoas, para discutir quais os cenários futuros em áreas tão distintas quanto a nanobiotecnologia, que vai revolucionar o próprio conceito de medicina; a política e suas novas formas de participação no futuro; a saúde dos oceanos e dos rios; o mundo pós-energia fóssil; as novas fronteiras da vida, inclusive com a inteligência artificial e o potencial das células-tronco; as novas fronteiras do universo, inclusive o potencial de viagens espaciais e exploração do espaço; os desafios da alimentação, tanto para eliminar a fome como para evitar a obesidade e o envenenamento por comidas prejudiciais à saúde; a nanotecnologia e a sua importância para o futuro em todas as áreas da tecnologia; e a evolução da moral e da conduta humana.
O evento possibilitou aos senadores situarem suas atividades e responsabilidades em defesa do Chile, levando em conta o que vai mudar no mundo nos próximos anos. Os que defendem que a economia é a base da razão de ser do progresso humano ficaram surpresos com os limites do crescimento e com o risco de mais uma vez ver o continente latino-americano fora das grandes mudanças no mundo.
Para um brasileiro, com o sentimento da dimensão de sermos a sexta economia do mundo, ficou a sensação de frustração porque corremos o risco de perder a chance de participar de mercado de cerca de US$ 100 bilhões, só na produção dos vetores e equipamentos da biotecnologia; ficar de fora da exploração espacial e do domínio das novas fontes de energia; do aproveitamento de todas as invenções ao redor do potencial da inteligência artificial; além do risco de perder o que já temos como exportadores de alimentos, diante das novas formas de alimentação.
Depois de três dias de debates, os senadores chilenos presentes e os que tomarão conhecimento dos conteúdos pela televisão perceberam o enorme esforço que devem fazer para que o Chile tente se sintonizar com a realidade mutante do mundo em direção ao futuro. Inclusive como fazer política, em um tempo no qual a comunicação entre eleitor e eleito já não é mais feita a cada quatro anos por comícios, mas instantaneamente, on-line, na qual o presente já é parte do futuro de um bom político.
Mas, se os senadores chilenos ficaram angustiados, imagine o senador brasileiro que, depois de sua palestra sobre o futuro, volta para participar de uma eleição para eleger a nova Mesa Diretora do Senado Federal; de total alienação nas últimas décadas em relação às responsabilidades para com o país, presa num dia a dia frustrante, sem poder e às vezes também sem pudor. Um Senado sem consciência de sua responsabilidade para com o futuro, como se a política fosse apenas acordos – nem sempre lícitos – para manter as vantagens que os cargos oferecem. Uma eleição que ocorre quando o mundo está mudando ao redor e se elege uma Mesa Diretora para nada mudar, simplesmente para manter o costume do velho ritmo de pensar apenas nas artimanhas políticas em que o passado nos viciou.