por CARLOS HEITOR CONY
Com a renúncia do papa, o incêndio na boate em Santa Maria (no Rio Grande do Sul), o desfile cafona no tapete vermelho, a rotineira e discutível premiação da Academia de Hollywood, mais uma vez a mídia revelou seu culto à redundância. Numa entrevista feita dias antes de se suicidar, Walmor Chagas também criticou a redundância de temas e recursos do teatro e do cinema, principalmente aqui, no Brasil.
Revelou que continuava a receber convites para atuar no palco, nas telas e na televisão, afinal, era um dos maiores atores em atividade. Mas os projetos que recebia eram tão repetitivos e alienados que ele recusava. Preferiu ir embora a aceitar papéis e temas que nada diziam à sua formação e ao seu gosto.
Deu até um exemplo: uma peça em que três líderes do movimento dos sem-terra são presos e interrogados por uma junta político-militar. Seria uma oportunidade para debater um problema antigo, mas atual. Da habilidade de produção, direção e interpretação haveria espaço para abrir um tipo de informação que costuma ser tratada como assunto que não rende público.
O homem comum pouco aparece nas diversas mídias tradicionais, com exceção, talvez, dos desabafos e ressentimentos despejados na internet. Na semana passada, soube de um caso que não foi noticiado, talvez pelo fato de ser comum e com personagens comuns. Uma doméstica de 22 anos foi estuprada pelo filho do patrão e engravidou.
Ela se virou como pôde até chegar a hora do parto. Um motorista de praça rodou com ela por vários hospitais, até que encontrou um que a aceitou. Teve a criança na pia da cozinha hospitalar. O filho nasceu, a mãe morreu por infecção.
Nelson Rodrigues faria disso uma peça que, certamente, seria proibida pela censura. Walmor Chagas preferiu ir embora.