Por Dora Kramer
Folha
Quando começou a circular, a ideia de que o Executivo pretendia firmar uma aliança com a instância máxima do Judiciário a fim de criar um atalho de ultrapassagem às dificuldades do Planalto no Legislativo pareceu muito esquisita. Mais que isso. Institucionalmente inexequível, social e politicamente inaceitável. Por uma questão básica: o preceito republicano da harmonia pressupõe a independência entre os Poderes. Cláusula pétrea.
O Supremo Tribunal Federal poderia se manter distante de acertos feitos sob a égide das conveniências políticas sem criar crise alguma e muito menos deixando de se manter fiel à função de guardião da Lei Maior.
VAREJO DA POLÍTICA – Não foi essa, no entanto, a escolha do STF. A maioria preferiu descer ao patamar do varejo da política para dar a mão e ser uma verdadeira mãe na resolução de problemas que o Planalto não conseguiu resolver pela via da negociação parlamentar. Os ministros prestaram-se ao serviço do socorro em várias ocasiões.
As duas mais recentes são particularmente espantosas, para não dizer desonrosas para a credibilidade da corte. A liminar e outros quatro votos a favor da cobrança de tributos das folhas de pagamentos de prefeituras e mais 17 setores privados levaram o Congresso a aceitar um acordo de meio-termo até então rejeitado em votações de clareza inequívoca.
Na ação de constitucionalidade da Lei das Estatais, os juízes abriram uma janela de admissão das indicações dadas por eles mesmo como inconstitucionais em cargos de conselhos e direção nas empresas feitas pelo atual governo, ao arrepio da Constituição.
GAMBIARRAS – Em ambos os casos o STF prestou-se a gambiarras muito semelhantes àquela que preservou os direitos políticos de Dilma Rousseff na decisão do impeachment.
Assim, o toma lá dá cá entre Legislativo e Executivo está incorporado como normal.
Já a entrada do Supremo no jogo em cena aberta sinaliza um novo anormal.