Ferreira Gullar avisava que determinadas coisas importantes não cabem em seu poema

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O jornalista, crítico de arte, teatrólogo, biógrafo, tradutor, memorialista, ensaísta e poeta maranhense José Ribamar Ferreira, o famoso Ferreira Gullar (1930-2016), explica por que “Não Há Vagas” para os dramas diários.

NÃO HÁ VAGAS
Ferreira Gullar

O preço do feijão
não cabe no poema.
O preço do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão.

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.

Como não cabe no poema
o operário
que esmerilha seu dia
de aço e carvão
nas oficinas escuras.
– porque o poema, senhores,
está fechado: “não há vagas”

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede
nem cheira.