Ministros admitem que fala de Barroso sobre bolsonarismo entregou o

Ministros do STF e de outros tribunais criticam fala de Barroso na UNE |  Metrópoles

Barroso apenas disse o que todo mundo já sabia sobre o STF

Monica Gugliano e Weslley Galzo
Estadão

A declaração do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso sobre “derrotar o bolsonarismo” não foi bem recebida pelos seus pares. O caso acabou levando uma crise para o período de recesso da Corte que afeta não só a imagem do ministro, mas também a do próprio tribunal.

“Nós estamos criando um futuro novo e enfrentando a desigualdade racial de modo que eu saio daqui com a energia renovada pela concordância e pela discordância, porque essa é a democracia que nós conquistamos. Nós derrotamos a censura, nós derrotamos a tortura, nós derrotamos o bolsonarismo para permitir a democracia e a manifestação livre de todas as pessoas”, disse Barroso em discurso no Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE).

CRÍTICAS VELADAS – Os ministros ouvidos pelo Estadão têm falado em conversas reservadas sobre a necessidade de não engrossar a pressão sobre Barroso com declarações públicas de condenação aos seus atos.

Esses mesmos ministros, contudo, têm dito reservadamente que as declarações do colega foram “inoportunas” e carregam consigo um alto potencial de reforçar a desconfiança de políticos e da sociedade civil em relação à atuação do STF.

Ministros ouvidos pelo jornal disseram sob condição de anonimato que as declarações de Barroso só servem para reforçar a percepção de setores da sociedade de que o STF agiu – e ainda age – por meio do chamado “ativismo judicial”.

DECISÕES POLÍTICAS – O conceito de ativismo judicial descreve o fenômeno de tribunais que aplicam intepretações mais amplas da lei e que, em alguns casos, passam a fazer política ao invadir competências de outros poderes.

A avaliação é compartilhada até mesmo entre ministros aposentados do STF, como Marco Aurélio Mello. Para ele, a Corte não pode se portar como responsável por vitórias ou derrotas eleitorais.

“Eu só posso atribuir isso a um ato falho do ministro, porque nós não derrotamos ninguém, principalmente o STF, que é a última trincheira da cidadania”, disse ao Estadão.

ZANIN NA MUDA – Um dos poucos integrantes da Corte que não manifestou internamente descontentamento com a declaração de Barroso foi o recém-aprovado Cristiano Zanin. O futuro ministro só toma posse no início de agosto. Até lá, ele optou por se recolher e não se envolver em polêmicas sobre o tribunal, sobretudo quando envolvem Barroso, que assumirá a presidência do Supremo e do Conselho Nacional de Justiça, órgão que julga conduta de juízes

Ciente da repercussão negativa de sua fala dentre e fora do STF, Barroso emitiu uma nota em que argumenta ter se referido a derrotar “o extremismo golpista e violento que se manifestou no 8 de janeiro”. O ministro ainda afirmou que não pretendia “ofender os 58 milhões de eleitores do ex-Presidente” Jair Bolsonaro (PL).

Mais cedo, a assessoria de imprensa do STF emitiu nota com os mesmos argumentos apresentados por Barroso de que a frase “‘nós derrotamos a ditadura e o bolsonarismo’ referia-se ao voto popular e não à atuação de qualquer instituição”.

MOURÃO PROTESTA – As declarações do ministro repercutiram negativamente entre apoiadores e aliados de Bolsonaro, como o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS). Ele disse que as decisões do ministro serão sempre tendenciosas”.

As críticas também vieram do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que repreendeu a postura de Barroso ao classificar a declaração como “inadequada e inoportuna”. O presidente da Casa Alta do Congresso ainda criticou a presença de Barroso no Congresso da UNE por, segundo ele, tratar-se de um evento de teor político.

“Se não houver um esclarecimento em relação a isso, mesmo uma retratação quanto a isso, até para se explicar a natureza do que foi dito, evidentemente que isso pode ser interpretado como uma causa de impedimento ou suspeição. Mas obviamente que isso cabe ao ministro e cabe ao Judiciário julgar, aí eu que digo que não posso interferir nesse tipo de discussão”, disse o presidente do Senado.