Uma lição poética de Thiago de Mello sobre a necessidade de se caminhar sozinho

TRIBUNA DA INTERNET

O poeta, jornalista e tradutor amazonense Amadeu Thiago de Mello (1926-2022) deixou a faculdade de Medicina para se dedicar à poesia. Durante a ditadura (1964-1985) foi preso e depois se exilou no Chile, onde encontrou Pablo Neruda, amigo e colaborador.

No exílio, também morou na Argentina, Portugal, França e Alemanha. Com o fim do regime militar, voltou ao Amazonas, onde viveu até sua morte.

NINGUÉM ME HABITA
Thiago de Mello

Ninguém me habita. A não ser
o milagre da matéria
que me faz capaz de amor,
e o mistério da memória
que urde o tempo em meus neurônios,
para que eu, vivendo agora,
possa merecer na outrora.

Ninguém me habita. Sozinho,
resvalo pelos declives
onde me esperam, me chamam
(meu ser me diz se as atendo)
feiúras que me fascinam,
belezas que me endoidecem.