O radicalismo se espraia. Pessoas que deveriam ser consideradas acima do bem e do mal são desqualificadas. Irmãos. Conhecidos. Ídolos do passado. Cada um de nós é capaz de contar, recentemente, quantos amigos perdeu? E só por terem opiniões diferentes das nossas. Já não se consegue argumentar.
Por José Paulo Cavalcanti Filho – Escritor, poeta,membro da Academia Pernambucana de Letras e um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Integrou a Comissão da Verdade.
Lisboa. De longe, tudo parece mais claro. Vivemos, hoje, uma crise de relações. Um curto circuito ético, jurídico e político. O esgotamento de certas práticas sociais. A ética da amizade. O compadrio. Sempre existiram conflitos, entre nós. Mas eram atenuados, antes. E isso, parece, está findando. Ruim, muito ruim, sobretudo porque a polaridade nas posições reduz a coesão social. Só para lembrar, no conto “O Alienista”, Machado de Assis relata que Simão Bacarmate internou 4/5 da população de Itaguaí em seu hospital psiquiátrico. Até que ele próprio ficou preso, por lá. Não queremos isso.
Intransigentes com os diferentes, nos últimos tempos somos generosos só com quem pensa como nós. Nesses, perdoamos tudo. Até apropriação do patrimônio público. Corrupção. Com todas as letras. Já não é possível esconder o grau assustador de saque ao Estado. Para fins eleitorais e, também, privados. Odebrecht, OAS, Friboi, por aí. Todos sabem disso. Embora nem todos deem a mesma importância ao fato. Alguns até acham isso Pop. Agem como se fossem parte de seitas – aproveitando a frase da carta de Palocci, nessa terça. Há os que se comportam como se ideologia fosse mais relevante. Sinto gana de acompanhar Jorge Amado e dizer que A ideologia é uma merda. Mas não vou tão longe. Certo é que esses perdoam tanta corrupção, docemente, como se fosse algo natural a nosso modelo político. E não é. Ou não deveria ser.
O radicalismo se espraia. Pessoas que deveriam ser consideradas acima do bem e do mal são desqualificadas. Irmãos. Conhecidos. Ídolos do passado. Cada um de nós é capaz de contar, recentemente, quantos amigos perdeu? E só por terem opiniões diferentes das nossas. Já não se consegue argumentar…