Por que o discurso de Tarcísio irritou bolsonaristas e até membros da família

 em ato  pró-Bolsonaro

A gente está aqui para pedir anistia e pacificação’, diz Tarcísio

Bela Megale
O Globo

O discurso de Tarcísio de Freitas no ato pró-Jair Bolsonaro na Avenida Paulista, no domingo (29), desagradou aliados próximos e até integrantes da família do ex-presidente.

A fala do governador de São Paulo, centrada nos ataques ao PT e ao governo Lula, foi vista como um discurso de candidato à Presidência, mas sem encampar as bandeiras do bolsonarismo.

POSICIONAMENTO – O fato de Tarcísio, mais uma vez, ter poupado o ministro Alexandre de Moraes e o Supremo Tribunal Federal (STF) foi o principal ponto de queixa entre bolsonaristas, já que havia a expectativa de que alguma crítica fosse dirigida ao Judiciário.

Eles avaliam que, com sua fala, o governador atrai a base do ex-presidente e evita carregar o ônus de se indispor com o Supremo.

— O Brasil não aguenta mais a desfaçatez, o gasto desenfreado, a corrupção. O Brasil não aguenta mais o governo gastador. Quem paga essa conta dos juros altos são vocês. O Brasil não aguenta mais aumento de imposto, não aguenta mais o PT — disse o governador.

“VOLTA, BOLSONARO” – As manifestações de Tarcísio para exaltar o capitão reformado e o coro “volta, Bolsonaro”, puxado pelo governador em São Paulo, são vistos nesse grupo de aliados do ex-presidente como uma estratégia de se mostrar fiel. Para eles, porém, Tarcísio já está focado em ser o sucessor de Bolsonaro em 2026, o que ele nega.

Na verdade, o governador de São Paulo ganha cada ganha vez mais apoio no campo da direita como nome para concorrer à Presidência contra Lula, mas ainda enfrenta resistência forte dos filhos de Jair Bolsonaro e de aliados muito próximos do ex-presidente.

A irritação de Eduardo Bolsonaro com Tarcísio seria por causa do crescimento do apoio do Centrão à candidatura de Tarcisio, em detrimento dos nomes do próprio Eduardo e da mulher Michelle.

Razões do crescente mal-estar em relação à democracia brasileira

Charges sobre democracia - 07/08/2020 - Política - Fotografia - Folha de S.Paulo

Charge do Benett (Folha)

Marcus André Melo
Folha

Cresce a percepção de que há algo errado em nossas instituições. Diria até que é quase consensual na opinião pública que as relações entre os três Poderes são disfuncionais. Isto se estende ao próprio funcionamento da democracia no país. Não temos dados para 2025, mas, segundo pesquisa sobre a satisfação com a democracia do Pew Research Center em setembro de 2024, o Brasil está ligeiramente abaixo da mediana global que é 45%.

Apenas 44% da população declaram estar satisfeitos com o funcionamento da democracia no país, enquanto 54% manifestam algum grau de insatisfação, dos quais 30% afirmam estar “nada satisfeitos”.

TENDÊNCIA OPOSTA – Paradoxalmente, vemos um aumento e não declínio de 7 pontos percentuais em relação a 2023. O Brasil opera na tendência oposta das democracias de alta renda, nas quais se observa queda acentuada nos últimos anos (de 49% em 2021 para 36% em 2024) na satisfação com a democracia.

Porém, o mais instigante para analisarmos o “malaise” na conjuntura atual sobre a democracia é como ela varia entre grupos de eleitores. Esta variação nos dá a chave para o consenso negativo atual sobre o funcionamento da democracia.

A percepção sobre o funcionamento das instituições é moldada por vários fatores já identificados em pesquisas sobre o assunto. Um fator decisivo é que ela difere entre os ganhadores e perdedores das eleições (o “winner-loser gap”, no jargão).

ESQUERDA E DIREITA – Há também fortes clivagens ideológicas: entre eleitores de esquerda, 56% estão satisfeitos; entre os de direita, apenas 35%. O fator mais determinante, porém, é o alinhamento com o governo: apoiadores da coalizão governista relatam níveis de satisfação 25 pontos percentuais mais altos que os opositores.

Esses dados revelam um padrão comum em democracias polarizadas: a legitimidade das instituições passa a ser filtrada pelo vínculo partidário, e a percepção de responsividade política se torna mais volátil.

A democracia é vista com mais confiança quando o “meu lado” está no poder, e com mais desconfiança quando está na oposição.

INSATISFAÇÃO – O que parece estar ocorrendo no momento é a queda da satisfação com a democracia entre os ganhadores, ou seja, entre os apoiadores da coalizão governista. Em “Strange Bedfellows” (Estranhos parceiros), os autores utilizam microdados de pesquisas com 18 mil eleitores de 46 países para testar a clivagem vencedor-perdedor em governos de coalizão.

Concluem que os parceiros da coalizão importam para a satisfação com a democracia. Nos casos em que há o que os autores chamam de “ambivalência de coalizão” —ou seja, se os parceiros de coalizão são rejeitados—, a avaliação do governo e do funcionamento da democracia piora.

O infortúnio faz estranhos companheiros de cama (Shakespeare, “A Tempestade”). Quando o Executivo se enfraquece, eles lhes dão as costas. Assim, entre os eleitores, os vencedores se veem como perdedores. Governar com más companhias cobra um preço entre vitoriosos. Mas mitiga a insatisfação entre os perdedores.

Itamaraty responde a “The Economist” após reportagem que arrasa com Lula

'The Economist': Lula perdeu influência no exterior e é cada vez menos  popular no BrasilRicardo Della Coletta
Folha

O governo Lula (PT) enviou uma carta à revista The Economist após a publicação britânica, em uma reportagem publicada no final de semana, ter classificado o presidente brasileiro como “incoerente no exterior” e “impopular em casa”.

De acordo com relatos de três pessoas que acompanham as conversas, a necessidade de uma manifestação do governo foi discutida em reuniões no Palácio do Planalto na segunda-feira (30).

VIA DIPLOMÁTICA – O primeiro compromisso de Lula no dia foi uma audiência com o chanceler Mauro Vieira, segundo agenda oficial. Nas conversas no Planalto, foi definido que o Itamaraty conduziria o processo. Na carta, assinada por Vieira, o ministro rebate argumentos da publicação britânica.

“Poucos líderes mundiais, como o presidente Lula, podem dizer que sustentam com a mesma coerência os quatro pilares essenciais à humanidade e ao planeta: democracia, sustentabilidade, paz e multilateralismo”, diz Vieira, na resposta.

“Como presidente do G20, Lula construiu um difícil consenso entre os membros, no ano passado, e ao longo do processo logrou criar uma ampla aliança global contra a fome e a pobreza. Também apresentou uma ousada proposta de taxação de bilionários que terá incomodado muitos oligarcas.”

MUNDO MULTIPOLAR – O chanceler também diz que o Brasil vê o Brics —bloco que a The Economist afirmou ter objetivos antiocidentais— como um ator incontornável na luta por um mundo multipolar, menos assimétrico e mais pacífico.

“A posição do Brasil quanto aos ataques ao Irã e, sobretudo, às instalações nucleares é coerente com esses princípios. Nossa condenação responde ao fato elementar de que essas ações constituem uma flagrante transgressão da Carta da ONU”, afirma Vieira.

“Para humanistas de todo o mundo, incluindo políticos, líderes empresariais, acadêmicos e defensores dos direitos humanos, o respeito à autoridade moral do presidente Lula é indiscutível”.

VIROU MUNIÇÃO – A reportagem da prestigiosa revista britânica com críticas a Lula virou munição para adversários políticos atacarem o petista.

Em publicação nas redes sociais, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), disse que a revista “humilha Lula” e que está na hora de o presidente “ir embora”. “Não dá mais para esse senhor ocupar o cargo mais importante do país. Chega”, escreveu.

O senador Sergio Moro (União Brasil-PR), declarado um juiz parcial pelo STF enquanto julgou o petista na Lava Jato, compartilhou a reportagem nas redes sociais e escreveu que a revista está “dando a real sobre o Lula”.

NA CONTRAMÃO – Na reportagem, a revista diz que o posicionamento do Itamaraty que condenou os ataques dos Estados Unidos contra instalações nucleares do Irã foi na contramão do que outras democracias ocidentais disseram sobre o tema.

A Economist afirma ainda que o Brasil de Lula, ao engajar-se num bloco dos Brics fortemente influenciado pelas agendas da China e da Rússia, adota posturas que parecem cada vez mais “hostis ao Ocidente”.

“O papel do Brasil no centro de um Brics expandido e dominado por um regime mais autoritário faz parte da política externa cada vez mais incoerente de Lula”, diz a revista.

Há ainda críticas no campo interno. A Economist menciona a queda de popularidade de Lula. Também destaca a votação no Congresso que derrubou um decreto presidencial que previa um aumento no IOF, fato que mostrou fragilidade na relação com Executivo com o Congresso.