Escritor amazonense Milton Hatoum é eleito para Academia Brasileira de Letras

Milton Hatoum já deu aulas na Universidade Federal do Amazonas e foi professor visitante na Universidade da Califórnia – Divulgação
O escritor Milton Hatoum, de 73 anos, foi eleito, nesta quinta-feira (14), para o Quadro de Membros Efetivos da Academia Brasileira de Letras (ABL). Com 33 dos 34 votos, o autor ocupará a Cadeira 6 da instituição, que estava vaga desde a morte do jornalista Cícero Sandroni, em junho.
Além de romancista, Hatoum é contista, ensaísta, tradutor e professor universitário. Em 1989, seu primeiro romance “Relato de um certo Oriente”, publicado pela Companhia das Letras, ganhou o Prêmio Jabuti de Melhor Romance e foi adaptado para o cinema com o filme de mesmo nome cuja direção é de Marcelo Gomes.
Já a obra “Dois Irmãos”, publicada em 2000, foi eleita o melhor romance brasileiro no período entre 1990 e 2005 em pesquisa realizada pelos jornais Correio Brasiliense e O Estado de Minas. O título foi publicado em Argentina, Alemanha, China, Espanha, Estados Unidos, Itália, França, Grécia, Holanda, Inglaterra, Líbano, Portugal, República Tcheca e Sérvia. Além disso, o livro recebeu uma adaptação para o audiovisual, com uma minissérie da TV Globo, sob direção de Luiz Fernando Carvalho e roteiro de Maria Camargo.
Presidente da ABL, Merval Pereira destacou que Hatoum é “o maior escritor brasileiro vivo e um romancista de primeira ordem”. “Vai ser muito útil para a gente, já colabora muito com a Revista Brasileira, agora vai ter a oportunidade de colaborar mais ainda”, pontuou.
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O acadêmico Ruy Castro comemorou a eleição de Hatoum. “Grande contribuição, grande romancista, representante de uma geração de ficcionistas. A Academia sempre teve gente de diversas origens, de todos os lugares, como João do Rio, Pedro Lessa. É uma geração mais jovem que está chegando e tem uma grande contribuição a dar”, destacou.
Miriam Leitão, que pela primeira vez participou de uma eleição na ABL, disse que Hatoum é um grande romancista, de primeira grandeza e categoria da literatura brasileira. “Chega trazendo todos os ecos do Brasil. Um Brasil que vem da Amazônia. A literatura dele é riquíssima, belíssima”, elogiou.
Milton Hatoum
Milton Hatoum nasceu em Manaus, em 1952. Em 1968, mudou-se para Brasília, onde estudou no Ciem, Colégio de Aplicação da Universidade de Brasília. Morou toda a década de 1970 em São Paulo e diplomou-se em Arquitetura Universidade de São Paulo, onde desenvolveu uma pesquisa sob a orientação do geógrafo Milton Santos. Entre 1978 e 1979, foi professor de História da Arquitetura na Universidade de Taubaté.
Em 1980, morou em Madri como bolsista do Instituto Ibero Americano de Cooperación. Entre 1981 e 1983, morou em Paris, onde cursou mestrado em literatura latino-americana. De 1984 a 1998, foi professor de língua e literatura francesa na Universidade Federal do Amazonas.
Em 1999, mudou-se para São Paulo, onde trabalhou colunista do Caderno 2 (O Estado de S. Paulo) entre 2008 e 2016. Foi colunista do jornal O Globo, do site Terra Magazine e da revista Entre livros.
O romance “Cinzas do Norte”, publicado em 2005, obteve diversos prêmios nacionais e internacionais. Milton recebeu a medalha da Ordem do Mérito Cultural do Ministério da Cultura do Brasil em 2008.
Em 2008, publicou seu quarto romance, “Órfãos do Eldorado”, adaptado para o cinema sob direção e roteiro de Guilherme Coelho, e, no ano seguinte, lançou o livro de contos “A Cidade Ilhada”, que inspirou o filme “O Rio do Desejo”, dirigido por Sergio Machado.
Em 2017, Milton iniciou a trilogia “O Lugar Mais Sombrio”, com o livro “A Noite da Espera”. O segundo livro, “Pontos de Fuga” foi lançado em 2019. No mês de outubro deste ano, a Companhia das Letras publicará “Dança de Enganos”, último volume da trilogia.
Os livros de Hatoum já ultrapassam 500 mil exemplares vendidos foram publicados em 17 países, e contam com uma extensa fortuna crítica no Brasil e no exterior. Traduziu para o português A cruzada das crianças(Marcel Schwob), Representações do Intelectual (Edward Said) e, em parceria com Samuel Titan, Três contos (Gustave Flaubert).
Hatoum tem publicado também ensaios e artigos sobre literatura brasileira e latino-americana em revistas e jornais do Brasil, da Espanha, França e Itália. Alguns de seus contos e ensaios saíram nas revistas Europe, Nouvelle Revue Française (França), Grand Street (Nova York), Quimera (México) e serrote. Participou de várias antologias de contos brasileiros organizadas na Alemanha e no México, e da Oxford Anthology of the Brazilian Short Story.

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Museu Carlos Pena Filho. Ou uma brisa azul. Por Luiz Otavio Cavalcanti

“Este campo vasto e cinzento, não tem começo nem fim.
Nem de leva desconfia, das coisas que vão em mim”.
Carlos Pena Filho, em Memórias do boi Serapião.

Primeiro, foi Maria Tânia Carneiro Leão. Ela disse que tem trabalhos inéditos e objetos de Carlos. Depois, foi Flavio Chaves. Que defendeu a instalação de um museu para o poeta.
A poesia pernambucana espera esse museu. O Recife e Olinda esperam este museu. O azul espera este museu. O tempo da maresia disse: passou do tempo. A pernambucanidade replicou: Carlos é Pernambuco. E Pernambuco é Carlos. No transitório do crepúsculo. E no permanente das estrelas.

A poesia de Carlos é um artesanato pernambucano. Artesanato da alegria, no olhar a magia do mundo, da mulher e das cores. E artesanato de insubmissão, contra a feiura do fazer, as carências e a desigualdade.

A poesia de Carlos é local. E universal. Borda os caminhos do lirismo. E do moderno. Como Manuel Bandeira visitou a casa de seu avô. Como João Cabral de Melo Neto pintou cores do Agreste. Como Joaquim Cardozo edificou a concretude nas palavras.

Essa coleção de sentimentos e expressões reclamam um espaço. Não só como memória do sentir e do ver do homem do trópico. Mas como testemunho e ato de defesa do patrimônio imaterial de Pernambuco.

E não há lugar mais apropriado para instalá-lo. Olinda. Que é origem e destino da obra do poeta. E, em Olinda, no Centro de Convenções. Que é traço de união física entre o Recife e Olinda. Assim como a poesia de Carlos é conjunção inspiradora entre mascates recifenses e jangadeiros olindenses.

O Museu Carlos Pena Filho é um aceno ao passado. E uma carta ao futuro. Volta-se para o que foi. E diz: vem, na continuidade da beleza e da imaginação. Dirige-se para o que virá. E diz: serás sempre, na pedra perpétua do reconhecimento vivo de Pernambuco.
Eis um trecho da carta de Jorge Amado a Carlos. Ao saber de sua morte, em 1960.
“Carlinhos,

Não, não desejo ir ao Recife, nem mesmo para chorar com Tânia e Otília, para fitar em silêncio a face de Eufrásio, para acariciar a cabeça de Clarinha. Nem mesmo para sentar-me com os amigos, com Rui e Paulo, com Caio e Zé Condé, e para recordar palavras tuas, momentos, histórias, gargalhadas. Nem mesmo para reencontrar-te nas pontes sobre o Capibaribe, no fundo da livraria, no bar, na casa do mestre Gilberto. Porque ainda não pude aceitar a ideia de que jpa não estás.”

Concluo com os versos iniciais do Soneto do desmantelo azul:

“Então, pintei de azul os meus sapatos, por não poder de azul as ruas. Depois, vesti meus gestos insensatos e colori as minhas mãos e as tuas”.