Ilustração reproduzida do Arquivo Google
A tragédia arde em chamas em nosso cotidiano. Mais uma. Outras virão, piores, a ponto de um dia esquecermos dessa. Pois somos uma sucessão histórica de tragédias. Nero queimou Roma, e Hitler carbonizou judeus. Russos e sírios bombardearam crianças. Americanos, traumatizados pela derrota para destemidos vietnamitas, sempre destroem nações periféricas. Tragédias nos humanizam. Overdose de multimeios expurgam toda dó, toda pena, todo horror. Esse estranho vício por manchetes angustiantes e inevitáveis interpretações e profecias de fim do mundo.
Doações, contas para familiares, fraudes, e perguntem aos familiares dos jogadores da Chapecoense como estão agora, que os holofotes mudaram para novas desgraças? Ou como estão os pobres das Bahamas, arruinados por furações furiosos? E o Haiti, onde parece haver um ponto de singularidade? Pois ditadura, guerra civil, terremoto, furacões, corrupção e degradação marcaram encontro num só ponto do planeta.
SOMOS ANIMALESCOS – Dito isso, é com certa tristeza que percebo não só o quanto a natureza humana é ainda embrionária. Constato o enorme caminho que termos de seguir nessa trajetória evolutiva que propõe passar de um estado animalesco para um ser divino.
E nosso microuniverso, seja nos lares, seja no ambiente de trabalho ou ainda no social, reflete nossa pequenez. Ofendemos, odiamos, conflitamos, nos estranhamos, nos magoamos, agredimos, fingimos, mentimos, traímos, pecamos.
Dia a dia, enquanto nós nos horrorizamos com a creche queimada pelo monstro, os anjinhos, pois assim os percebo, poderiam ser um filho, um neto de qualquer um de nós.
NOSSAS RELAÇÕES – Mas como estão nossas relações com nossos rebentos? Como anda seu casamento? E o respeito e a cooperação no ambiente de trabalho? Como é sua comunidade? E seu vizinho?
O perigo está embaixo de nosso nariz, dorme a nosso lado, frequenta os mesmos lugares. Pois onde faltam humanismo, fraternidade, amor ao próximo, perdão, respeito às diferenças, empatia, seremos testemunhas passivas de tragédias ou vítimas inocentes delas.
Entender nossa imperfeição, encarar nossa incompletude, assumir-nos transitórios, pecadores, aprendizes da vida são algo libertador, um primeiro passo.
AINDA FALTA MUITO – A paz, a felicidade, a serenidade são um trabalho pesado, cotidiano, eterno, íntimo e pessoal. Só então – se é que – compreenderemos essa época difícil, de mudanças profundas por que passa a nossa civilização.
Sempre fomos brutais. O que mudou é a visibilidade. A delicadeza, a lapidação de mentes e almas é um trabalho de formiguinha. Imperceptível, silente, constante. E creia, não dá Ibope.
Eduardo Aquino
O Tempo