Manchete 30 anos

  por Leila Pinheiro

Uma triste imagem. O famoso M da Rede Manchete, velho e enferrujado,  à venda numa decadente loja de antiguidades às margens da BR-465 (antiga Rio-São Paulo), é o retrato vivo da decadência de uma emissora que há exatos 30 anos, fez tremer a concorrência. Vale relembrar aquele tempo.

No dia 5 de junho de 1983, houve um frisson no mercado. Afinal, estava nascendo uma emissora do Grupo Bloch, especialista em editar revistas primorosas que fizeram história como a Fatos e Fotos e a própria Manchete, por exemplo.

Os profissionais de jornalismo da Globo, na época, foram alertados pela direção para prestarem atenção ao trabalho editorial do novo canal, afinal estava ali nascendo a primeira concorrente de peso da emissora dos Marinho, um duelo de famílias experientes no segmento de informação, tendo a Globo, claro, vantagens pelo seu tempo de vida e qualidade visual.

Mas a TV Manchete chegou com tudo em cima com uma programação diferenciada, cenários arrojados e futuristas, e a ousada bancada de aço escovado em seu principal telejornal.

A sede da emissora, também carioca a exemplo da Globo, ficava num local privilegiado. Na Rua do Russel, bem em frente a um dos mais conhecidos cartões postais da cidade, o Pão de Açúcar.

Trabalhamos, Eliakim e eu,  quase 4 anos na TV Manchete e para nós foi um marco na carreira. Egressos da Globo, sentimos uma liberdade e um respeito profissional que perseguíamos há muito tempo. Gratificante sentar na bancada e acompanhar, numa telinha ao lado, os números cada vez mais crescentes do Ibope na época de Kananga do Japão, Pantanal e Ana Raio, novelas que marcaram época e sucediam ao Jornal da Manchete.

O que mais impressionava aos que chegavam à emissora era a garra dos profissionais que começaram junto com a Manchete.  Havia uma tal cumplicidade entre os departamentos que parecia estarmos em uma grande e verdadeira família,   lutando pelo sucesso e pelo bom desempenho de um projeto revolucionário de TV no Brasil.

O resultado final no vídeo era cativante. No jornalismo e sobretudo nas novelas, a Manchete abriu as portas para a criatividade de muitos autores e diretores que jamais tinham experimentado tamanha liberdade de expressão em outra emissora. Foi o que fez de Pantanal, a saga de Benedito Ruy Barbosa, um verdadeiro divisor de águas na história da teledramaturgia brasileira.

Mas, seguindo a lamentável profecia de que “tudo que é bom dura pouco”, a TV Manchete entrou em declínio, abalada por graves problemas financeiros.  Foi vendida a um empresário de São Paulo e retomada pela família Bloch pouco tempo depois. Mas, já sem forças para seguir no caminho que a consagrou.

Em 10 de maio de 1999, a TV Manchete fazia sua última transmissão e fechava as portas de seus estúdios na Rua do Russell de maneira melancólica, deixando milhares de profissionais e suas famílias entregues ao desespero por não ter dinheiro para pagar as contas.

Soubemos hoje, na véspera do aniversário da  primeira transmissão da TV Manchete, que grande parte do material usado pela emissora está sendo vendido como sucata, a preço de banana,  em ferros velhos.

Se houve incompetência em sua gestão, não cabe aqui questionar. Esta coluna é mais um desabafo emocional do que um ajuste de contas com administradores da extinta Manchete.

E já que iniciamos a coluna com a foto do M que ficava no topo do edifício das empresas Bloch, vamos vê-lo aqui em movimento, na espetacular abertura e encerramento da programação da rede. Uma imagem que até hoje povoa o imaginário dos telespectadores e, especialmente, de quem teve o privilégio de trabalhar na Manchete em seus tempos de glória.

[youtube http://www.youtube.com/watch?v=5aqal2dIjwg&w=420&h=315]

Famosa vinheta de abertura e encerramento da programação da Rede Manchete em que a letra “M”, símbolo da emissora, sobrevoa alguns locais do Brasil.