LETRAS NO CAMINHO

 

A Secretaria Estadual de Meio Ambiente, o grupo Bongar, a Casa Fliporto, a Confraria do Rosário dos Homens Pretos e a Prefeitura de Olinda promovem, no dia 25 deste maio, uma cerimônia para comemorar o Dia da África. Será às 15h, com o plantio de uma muda de baobá, trazida da África, na proximidade do viaduto erguido no girador do Complexo de Salgadinho, em Olinda.

O ritual, que vai ser presidido pelo babalorixá Ivo de Xambá, é da tradição africana de reverência à árvore sagrada. Terreiros do Recife e de Olinda e comunidades quilombolas, que prestam culto ao baobá, vão participar. E o Bongar, comandado pelo mestre Guitinho da Xambá, vai cuidar da parte musical.

Baobá (Foto: reprodução da internet)

Premonição*
Natanael Lima Jr
Imagem: Reprodução
 
 
 
 
 
 
 
A cidade aflita deixa existir:
o caos, o medo, o pânico
em mim.
O medo prometeu
embora (ainda) acorrentado
transgredir o fim.

*In À espera do último girassol e outros poemas, 2011, p. 79

É POR AÍ

“Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de Oliveira, de Érico Veríssimo – que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras.” (Mário Quintana – Poeta)

 

VAMOQVAMO

“Não dá para viver sem um truque. Eu me declarei morto. É uma sensação tranquila essa da gente se saber morto. Clandestino morto. Insuspeitado morto. Na tripulação do mundo. Já não me sinto comprometido com nada, mas continuo como testemunha do espetáculo. Não mais como cúmplice e nem vítima. Este é o meu truque.” (Carlos Heitor Cony – Escritor)
Canção na plenitude*
Lya Luft
Imagem: Reprodução
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.
*texto extraído do livro “Secreta Mirada”, Editora Mandarim – São Paulo, 1997, pág. 151.
Náufraga de si mesma*
Lucila Nogueira
         a Antônio Campos
 
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náufraga de si mesma
eu a vi perambular pelo metrô
descalça nas calçadas
eu a vi naquela manhã de domingo
olhos cheios de água
eu a vi sob a chuva que não termina
deitada sobre a grama
eu a vi enfim e afinal ser possuída
e ela se evaporar sem resistência
vitoriosa em direção ao sol
*poema extraído do livro “mas não demores tanto”, Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2011, pág. 63.
Porque
Sophia de Mello Breyner Andresen*
(1919 – 2004)
 
Imagem: Reprodução
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendos.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
*Sophia de Mello Breyner Andresen foi uma das mais importantes poetas portuguesas do século XX. Foi a primeira mulher portuguesa a receber o mais importante galardão literário da língua portuguesa, o Prêmio Camões, em 1999.
Momento
Taciana Valença*
 
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Contudo restou-me desabar no sofá
Cabelos molhados, camiseta
Um filme bobo, meio cabeça
Um resto de vinho do porto
Uma sombra de tristeza…

A saudade rondando a sala
Vinha ébria d’algum lugar….

Aproveitando-se da noite insone
Resolvida a me acompanhar….

Um rastro de luz
Vindo do corredor

O olhar perdido
Entre a alegria e a dor…

*Taciana Valença é editora da Revista Perto de Casa

Poema para este dia
Márcia Maracajá*
 
Imagem: Reprodução
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Por todo sim e não,
Mulheres-mães com ou sem filhos,
Estamos ligadas à criação,
Cuidando do mundo agredido,
Que pede socorro embrutecido,
E carinho e atenção
Somos filhas das filhas de quem outrora
Tinha legião de seres aprendido
Que a natureza merece adoração,
Ante qualquer homem na terra em beleza,
Inteligência, força e argumentação
Somos mães, mulheres, pungentes
Na dança da vida em celebração
Mãos dadas para o todo,
Eternamente
Luz divina em carne, osso
Somos o caldeirão
Sagrado, profanado
Castigado
Pelo seu legado, vida em profusão
Pelejante, avante!
Mãe, mulher
Faça de sua vida o que quiser
Respeitando a sagrada força de Esther
Primaverando nos invernos de nossas vidas!

*Márcia Maracajá é escritora blogueira, performer literária e consultora textual

Sou um gato (conto) de Lygia Fagundes Telles*
  
Imagem: Reprodução
Ele fixaria em Deus aquele olhar verde-esmeralda com uma leve poeira de ouro no fundo. E não obedeceria porque gato não obedece. Quando a ordem coincide com sua vontade, ele atende mas sem a humildade do cachorro, o gato não é humilde, ele traz viva a memória da liberdade sem coleira. Despreza o poder porque despreza a servidão. Nem servo de Deus. Nem servo do Diabo. Lembro agora daquela história que ouvi na infância e acreditei porque na infância a gente só acredita. Mais tarde,
conhecendo melhor o gato é que descobri que jamais ele teria esse comportamento, questão de caráter. Dizia a história que Deus pediu água ao cachorro que lavou lindamente o copo e com sorrisos foi levá-lo ao Senhor. Pedido igual foi
feito ao gato e o que ele fez? Escolheu um copo todo rachado, fez pipi dentro e dando gargalhadas entregou o copo na mão divina. Conheço bem o gato e sei que ele jamais se comportaria conforme aquela antiga história. O cachorro, sim, bem- humorado faria tudo o que fez ao passo que o gato ouviria a ordem divina mas continuaria calmamente deitado na sua almofada, apenas olhando. Quando se cansasse de olhar, recolheria as patas no calor do peito assim como o chinês antigo recolhia as mãos nas mangas do quimono. Elegante.  Calmo. E mergulharia no sono sem sonhos, gato sonha menos do que o cachorro que até dormindo parece mais com o homem. Outro ponto discutível: dando gargalhadas? Mas gato não dá gargalhadas, é o cachorro que ri abanando o rabo naquele jeito natural de manifestar alegria. Os meus
cachorros — e tive tantos — chegavam mesmo a rolar de rir, a boca arreganhada até o último dente. O gato apenas sorri no ligeiro movimento de baixar as orelhas e apertar um pouco os olhos como se os ferisse a luz, esse o sorriso do gato. Secreto. E distante. Nem melhor nem pior do que o cachorro mas diferente. Fingido? Não, porque ele nemse dá ao trabalho de fingir. Preguiçoso, isso sim. Caviloso. Essa palavra saiu demoda mas deveria voltar porque não existe definição melhor para um felino. E para certas pessoas que falam pouco e olham muito. Cavilosidade sugere cuidado, afinal,
cave é aquele recôncavo onde o vinho fica envelhecendo em silêncio, no escuro. Na cave o gato se esconde solitário, porque sabe do perigo das aproximações. Mas o cachorro, esse se revela e se expõe com inocência, Aqui estou!

*Texto extraído do livro “A disciplina do amor”, Companhia das Letras, 2010

Eventos Literários

FESTIVAL INTERNACIONAL DE POESIA DO RECIFE – ANO 2
23 A 26 DE MAIO DE 2013
 
 
Realizado pelo Governo do Estado, através da Fundarpe e da Secretaria de Cultura, entre 23 e 26 de maio, o Festival contará com recitais e rodas de poesia, bate-papos, minicursos, intervenções e performances.
O polo principal do evento será na Torre Malakoff, no poético Bairro do Recife.
 
 
PROGRAMAÇÃO LABORATÓRIO DE AUTORIA LITERÁRIA ASCENSO FERREI
 
 
 
 
MAIO/2013
21 a 24 (terça a sexta) – 09h às 12h
Oficina de Criação Poética, com Affonso Romano de Sant’Anna (MG/RJ)
Local: Laboratório de Autoria Literária Ascenso Ferreira
28 (terça) – 19h30
Um escritor na minha escola, com Alexandre Furtado (PE) e Cícero Belmar (PE). Mediação de Inácio França (PE).
Local: Escola do Sesc Santa Rita
Programação completa no site: www.sescpe.com.br
 
 
13ª FEIRA NACIONAL DO LIVRO DE RIBEIRÃO PRETO – SP
DE 06 A 16 DE JUNHO/2013
 
 
A 13ª edição da Feira do Livro de Ribeirão Preto (313 km de SP) terá 625 atividades literárias entre palestras e debates, além de peças teatrais e shows musicais. A programação do evento, a ser realizado entre 6 e 16 de junho, foi lançada nesta quinta-feira (16) no Palácio Rio Branco, sede da prefeitura.
A expectativa é que 600 mil pessoas participem da feira. “Queremos nos igualar à Bienal do Livro de São Paulo”, disse a presidente da Fundação Feira do Livro, Isabel de Farias. A montagem da estrutura e pagamento de cachês de artistas e escritores participantes está orçada em R$ 3,4 milhões.

Confira a programação completa no site: www.feiradolivroribeirao.com.br

O Índio Enganou Piaget

por Frederico Spencer*
frederico_spencer@hotmail.com

  
 Imagem: Reprodução
A cena acontece como em qualquer comunidade indígena: crianças livres correm, pulam no rio, inventam brinquedos, brincam com a terra e a água, bebem do rio, dormem ao relento nos dias de festa, aprendem com os mais velhos através das estórias de seus antepassados. Com as lendas, por trás das chamas de uma fogueira que queima o frio, sonham, experimentam a realidade através das experiências vivenciadas pelas brincadeiras construídas no seu cotidiano, assim, dormem ao final do dia, sonhando com o nascer de outro sol.
O adulto da aldeia participa das brincadeiras, qual criança no carretel leve do dia. Ensina as obrigações da vida aos pequenos, tais como caçar, pescar, até a arte da guerra, espera que os menores entendam, senão, pelo peixe do dia. Assim, os conhecimentos vão sendo passados pelas gerações de acordo com a brincadeira do dia, inventadas e compartilhadas por todos da aldeia.
Em seu processo de aprendizagem, a criança indígena cresce vivenciando sua relação intrínseca com a natureza. Nessa integração, o tempo não é cronológico, mas passional, entre o ser que a vivencia e o objeto de desejo que se faz através do imaginário e, pela estética, mediada pela busca da satisfação das necessidades de sobrevivência. Na aldeia tudo é experimentado, tudo é aprendizagem. Sem os rótulos da razão, aprende-se comendo a caça e a pesca da fome do dia.
Ao índio pequeno, não lhe é cobrado que constitua seu modo de pensar e construir o mundo através de sua idade cronológica, mas pela vivência de sua cultura. Seu tempo é o de sua resposta aos estímulos recebidos através das lendas, das brincadeiras, dos modelos das práticas dos mais velhos, dessa maneira, vai se tecendo na prática da vida, fora do tempo dos relógios e das fórmulas mágicas de aprendizado.
Ao menino urbano, oferecemos fórmulas compactadas de aprendizado, de acordo com sua idade. Em seu processo de aprendizagem são oferecidos conteúdos formatados pela cultura de consumo de massa, oriundos da ideologia de mercado, ideologia esta, imposta através das campanhas de publicidade, dessa maneira, são construídos os desejos de mundo da criança moderna.
Mais do que um modelo de olhar e interagir com o mundo, essas duas culturas divergem no modo de sua construção. Uma é constituída pelos mitos e lendas que povoam o imaginário coletivo, voltada exclusivamente ao respeito à natureza, ao bem estar e à preservação dos valores culturais. A outra se valoriza pela perpetuação do conceito de mercadologização das relações, sejam essas pessoais ou de relação de mercado.
Diferentemente da letra da música dos TITÃS: “homem primata, capitalismo selvagem”, diria eu: capitalismo selvagem, homem primata, envolto em sua selva de plástico e antenas.
*Frederico Spencer é poeta, sociólogo e psicopedagogo

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