Dois filmes

 

     por Luis Fernando Veríssimo

Os filmes “Gravidade” e “Até o fim” têm em comum o tema da sobrevivência em ambientes hostis e o malabarismo técnico. Em tudo mais, são opostos. Não se fica sabendo nada sobre o personagem único de “Até o fim” — nem nome, nem passado, nem nada — e assim pode-se escolher entre vê-lo como um símbolo universal da espécie humana em confronto com a Natureza ou como um ator famoso chamado Robert Redford metido numa aventura para a qual não tem mais idade.

 

Já da Sandra Bullock em “Gravidade” sabemos tudo, inclusive seu passado trágico. É mais fácil simpatizar com ela do que com o enigmático Robert. Os dois filmes também são opostos porque seus personagens são vítimas de elementos contrários, ar de menos e água demais.

 

A pobre da Sandra sofre com a falta de atmosfera e o Robert com um excesso de mar. Se os dois se encontrassem para jantar no fim das suas respectivas odisseias solitárias, concordariam que bom mesmo é terra firme.

 

Extraordinários, nos dois filmes, são os efeitos especiais. Não existe mais nada que um bom computador e alguns milhões de dólares não possam reproduzir com realismo irretocável. Foi notado que o diretor de “Gravidade”, Alfonso Cuarón, é o primeiro latino-americano a ganhar um Oscar de direção, e menos notado que ele ganhou com um filme pouco “mexicano”, um adjetivo indefinível que certamente não inclui a engenhosidade técnica necessária tanto para ter um programa espacial quanto para fazer um filme a respeito. O México agora pode dizer que também já teve sua missão espacial, comandada pelo Cuarón. Fictícia, mas admirável.

 

 

 

 

Sandra Bullock no filme “Gravidade”

 

 

 

E alguém mais notou que o contêiner abandonado no mar que se choca com o barco do Robert e começa sua agonia carregava sandálias havaianas, que boiam? Se não é ironia, é marketing.

 

PRECISAVA?

 

A volta do ioiô e do bambolê, tudo bem. Mas precisava voltar a Guerra Fria? Tantas outras coisas poderiam voltar em vez do equilíbrio do terror entre potências nucleares… Aquelas balas de coco que colavam no céu da boca, por exemplo. Baleiros nos cinemas. Filmes de caubói. Programas de auditório. “O vigilante rodoviário” . Os “Patrulheiros Toddy”!

 

Mas não, o que volta é a Guerra Fria. Pela Ucrânia, gente. (Dizem que nos Estados Unidos já tem gente tirando as bicicletas quebradas, os long plays e o resto da tralha acumulada dos abrigos antiaéreos, para o caso de o Putin atacar).

 

PAPO VOVÔ

 

A Lucinda, nossa neta de quase 6 anos, nos surpreende com seu vocabulário. Mas, felizmente, ainda não sabe tudo, embora pense que sabe. No outro dia nos contava de um personagem da TV que perdera a memória e disse que ele estava com “maionésia”.

 

 

 

Luis Fernando Veríssimo é escritor.