Conversas de 1/2 minuto (26). Por José Paulo Cavalcanti Filho

O senhor foi juiz? – Fui. – E quando largou o apito?

  Por José Paulo Cavalcanti Filho  –  Escritor, poeta, membro das Academias Pernambucana de Letras, Brasileira de Letras e Portuguesa de Letras. É  um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Integrou a Comissão da Verdade

ADMALDO MATOS, advogado. Com caso para decidir, na Secretaria da Fazenda de Pernambuco, chamou o procurador João Pinheiro Lins e pediu parecer. Ele

? O que deseja?

? Só diga o que achar certo.

E João, balançando os dedos no rosto de Admaldo, sentenciou

? Está pensando o quê? Eu não estou aqui para obedecer nenhuma lei, meu papel é só dar fundamento jurídico às arbitrariedades da administração.

 ANTÓNIO VALDEMAR, escritor. Lembrou casos reais ocorridos nos tribunais de Lisboa:

– Advogado: Qual foi a primeira coisa que disse o seu marido quando acordou, aquela manhã?

– Testemunha: Ele disse Onde estou?, Berta.

– Advogado: E por que é que se aborreceu?

– Testemunha: O meu nome é Célia.

* * *

– Advogado: Aqui no tribunal, para cada pergunta que eu lhe fizer, a sua resposta deve ser oral, está bem?

– Testemunha: Sim.

– Advogado: Que escola frequenta?

– Testemunha: Oral.

* * *

– Advogado: Doutor, antes de fazer a autópsia, o senhor verificou o pulso da vítima?

– Testemunha: Não.

– Advogado: O senhor verificou a pressão arterial?

– Testemunha: Não.

– Advogado: O senhor verificou a respiração?

– Testemunha: Não.

– Advogado: Então é possível que a vítima estivesse viva quando a autópsia começou?

– Testemunha: Não.

– Advogado: Como é que o senhor pode ter a certeza?

– Testemunha: Porque o cérebro do paciente estava num jarro sobre a mesa.

– Advogado: Mas ele ainda poderia estar vivo?

– Testemunha: Sim, é possível que estivesse vivo a tirar o curso de Direito em algum lugar!!!

FERNANDO LYRA, ministro da Justiça. Lyra me procura, feliz,

? A Câmara de Vereadores de Caruaru (Pernambuco) decidiu dar meu nome a um novo conjunto habitacional que vai ser inaugurado. Por favor, redija o parecer da Comissão de Justiça para fundamentar a votação.

? Má notícia, amigo. É que você vai precisar ir para o céu, antes. A Lei 6.454/77 só permite nome em “logradouros e monumentos públicos” depois que o cidadão morre. Infelizmente. Ou não, que você ainda está vivo.

Foi embora irritado. Um mês depois, mostrou lei criando o “Conjunto Habitacional Fernando Soares Lyra”. E parecer da Câmara firmado por um jurista/vereador. Dizia mais ou menos assim (resumo):

? Há homens mortais e aqueles eternos. Para os primeiros, o tempo conta. Já para os outros, não. Que, por tudo que fizeram, jamais serão esquecidos. A lei dos nomes vale só para mortais. E, nunca, para eternos ainda em vida. Como Fernando Lyra. Por isso, nada impede que se dê o nome do ministro a esse Conjunto Habitacional.

E Fernando completou

? Juristas bons são os de Caruaru.

GENTIL MENDONÇA FILHOadvogado trabalhista. Fomos colegas de classe no Colégio Nóbrega. E próximos, ao longo de nossas vidas. Começo de fevereiro, vésperas do Carnaval, estava num quarto de hospital e pediu para falar comigo. Foi a última conversa que tivemos. Vesti avental de papel, máscara no rosto, essas coisas de proteção para os pacientes e entrei. Ele, sem meias palavras,

– É danado, amigo Zé Paulo.

– Pare com isso, Gentilzinho, amanhã você já está bom.

– Levei os exames que o doutor pediu, perguntei o que é que eu tinha, e sabe o que ele respondeu?

– Não…

– Doutor Gentil, o senhor está apodrecendo.

Pouco depois acabou, no dia 11, quinta feira. Na véspera, foi quarta-feira de cinzas. Agora, as cinzas eram ele. Vida injusta. “E para ti, ó Morte, vá a nossa alma e a nossa crença, a nossa esperança e a nossa saudação!”, palavras de Fernando Pessoa (Bernardo Soares, no Livro Desassossego). Quando refiz o diálogo, escrevi “Você está morrendo”. Sua viúva, Paula, a quem pedi autorização para contar essa história, corrigiu

– Foi assim não, eu estava presente.

Riscou morrendo e escreveu, em seu lugar, a palavra correta, apodrecendo. Viva Gentil.

GIBRALDO MOURA COELHO, advogado penalista. Na Ditadura, quando Nilo Coelho foi nomeado governador de Pernambuco, a gente ficava dizendo ao velho comunista

– Agora você vai se apresentar, dando ênfase no sobrenome, como Gibraldo Coelho (assim era conhecido). Só para ter vantagens, nas delegacias, por pensarem que é parente do governador.

– Parem com isso, por favor, todos sabem que sempre fui oposição.

– Nada, Gibraldo, você quer mesmo é faturar.

E foi tanta brincadeira que tomou uma decisão drástica. Trocou de nome. Passando a ser, para todos os fins, Gibraldo Moura. Na placa do escritório, nos papéis, no catálogo telefônico, nos cartões de visita. Só não contava é que o governador que substituiu Nilo Coelho fosse José… Moura. Como ele, agora, Gibraldo Moura. E não perdi a oportunidade

– Bicho inteligente, virou Moura só para se aproveitar do sobrenome.

– Aqui para nós, amigo, Ele não foi justo.

– Ele quem?, Gibraldo.

– Deus, Zé Paulo. Deus.

 (MARCELO NAVARRO) RIBEIRO DANTAS, ministro do STJ. Em 14/07/2022, mandou mensagem

– Viva os 107 anos do glorioso América Futebol Clube, de Natal.

Após o que completou

– Outro evento, de menor importância, são os 233 anos da Revolução Francesa.

* * *

Mandou foto de placa em barzinho que frequenta, na Praia de Pirangi (RGN),

? Pão na chapa:

Com manteiga, 2,50.

Com margarina, 2,00.

Sem manteiga, 1,50.

Sem margarina, 1,00.

* * *

Ao pensar nas dores da alma, escreveu

– Amargura?

Amar cura.

Solidariedade?

Só lhe dar a idade.

Morri?

Amar, ri.

Sentimento?

Sem ti minto.

Jamais?

Já, mas…

ROBERTO ROSAS, advogado. Lembrou que perguntaram ao Ministro Orozimbo Nonato, do Supremo,

– O senhor foi juiz?

– Fui.

– E quando largou o apito?