Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc – Fausto Freitas partiu na manhã deste sábado para morar no infinito. Deixou a vida com a serenidade dos que sabem que cumpriram sua jornada, como quem fecha um livro depois de percorrer todas as suas páginas com atenção e paixão. Ex-presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, sua trajetória foi marcada pela moderação e pelo equilíbrio, qualidades que o tornaram um pacificador nato, um homem capaz de atravessar a vida política sem deixar inimigos pelo caminho.
Mas Fausto Freitas era mais que isso. Ele era um devoto das artes e um eterno apaixonado pela história da cultura. Sempre que nos encontrávamos, a conversa enveredava pelos labirintos literários, pelas curvas e contornos das grandes obras artísticas. E quando surgia o nome de Leonardo da Vinci, os olhos de Fausto brilhavam, como se ele estivesse diante de um altar de sabedoria.
Da Vinci fascinava Fausto. O gênio renascentista, que dominava ciências, engenharia, arquitetura e pintura, despertava nele um encanto especial. E dentre todas as maravilhas criadas por Da Vinci, havia uma que arrebatava o coração de Fausto: aquela misteriosa figura que sorri com um ar enigmático, a Monalisa.
“Olha o rosto…”, dizia ele, admirando uma fotografia da pintura. “O olhar… o sorriso… Isso é inexplicável.” Fausto não apenas apreciava essa obra; ele a venerava. Talvez porque, aos olhos dele, não era apenas uma pintura, mas uma presença. Algo que ultrapassava a tela, que tocava a alma e deixava perguntas suspensas no ar.
Mas Fausto não limitava sua admiração às artes plásticas. Em nossas conversas, ele frequentemente evocava outro gênio: Johann Wolfgang von Goethe. A obra Fausto, escrita pelo mestre alemão, era outra de suas paixões. Ele dizia que aquele personagem, tão complexo e atormentado pela sede de saber e pela busca do sentido da vida, espelhava a inquietação que habita os espíritos mais cultos. “Em cada um de nós há um pouco de Fausto”, costumava dizer. E completava: “A grande tragédia da vida é não encontrar a verdadeira sabedoria no tempo certo”.
Imagino que agora, nesse novo plano, Fausto e Leonardo Da Vinci estejam frente a frente. E que Fausto, com seu jeito terno e culto, logo pergunte ao gênio renascentista:
— Mestre, quem ama mais essa a Monalisa: você ou eu?
E então, talvez, Leonardo sorria aquele mesmo sorriso enigmático e responda com mistério:
— Cada um de nós ama a sua musa com a intensidade e carinho que nos toca o pulsar do coração.
Porque Fausto, na verdade, sempre acreditou que a verdadeira grandeza das obras de arte estava na capacidade de se multiplicarem. Que cada pessoa que cruzasse seu caminho poderia encontrar, em algum olhar, em algum sorriso, a mesma beleza encantadora e misteriosa que o fascinava tanto. Para Fausto, essa obra não era apenas uma figura no Louvre, mas uma expressão viva que se revelava nos momentos mais inesperados — talvez na ternura de um gesto, na doçura de um olhar ou na simplicidade de um sorriso que toca a alma e aquece o coração.
Talvez, por isso, Fausto tenha partido levando consigo uma lembrança só dele — íntima e silenciosa, que apenas ele saberia decifrar. Essa lembrança não se revela nas páginas da história, nem nas paredes dos museus, mas sim nas entrelinhas da vida, onde a arte se mistura ao afeto e transforma um simples instante em eternidade.
Fausto Freitas partiu. Mas deixou na vida um encanto silencioso, para que o mundo, mesmo desapercebido, continue sendo mais bonito e cheio de mistério. Que ele siga agora no infinito, debatendo com Da Vinci os segredos dos sorrisos que encantam o mundo.