Camões: 500 anos de um legado poético que exalta Portugal e sua história. Por Flávio Chaves

 Por Flávio Chaves – Jornalista, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc        O mundo literário celebra,  este ano, o quinto centenário de Luís Vaz de Camões, o maior poeta de língua portuguesa e uma das figuras mais representativas do Renascimento. Nascido por volta de 1524 ou 1525, a data exata permanece um mistério, assim como grande parte da vida do autor. Contudo, o que se sabe é o suficiente para entender a profundidade de seu trabalho e o impacto de sua obra-prima, Os Lusíadas, que até hoje ecoa nas letras e na cultura mundial.

Camões viveu em um período decisivo da história de Portugal, no auge das grandes navegações, quando o império português se expandia pelos oceanos, abrindo novas rotas comerciais e culturais para o mundo. Foi uma era de descobertas, de glórias e também de tragédias. Esse contexto moldou o poeta, que vivenciou em primeira mão os contrastes de uma nação navegadora, desde os feitos heroicos até as complexidades da colonização e da exploração. É na síntese dessas vivências que surge sua maior criação literária: Os Lusíadas.

A epopeia camoniana, publicada em 1572, narra poeticamente as aventuras e conquistas dos portugueses, tendo como eixo a viagem de Vasco da Gama à Índia. Ao longo dos dez cantos da obra, Camões eterniza heróis como o próprio Vasco da Gama e mitifica o povo português, retratando-o como destemido e nobre. Ele celebra não apenas a coragem dos navegadores, mas também o espírito de uma nação pequena em território, mas vasta em ambições. Portugal, sob a pena de Camões, se agiganta, torna-se um protagonista da história universal.

Mas Os Lusíadas não é apenas uma narrativa de glórias. Camões, com seu olhar agudo, também explora as consequências dessas façanhas. Ele não foge da realidade sombria da exploração e da brutalidade que permeiam as conquistas coloniais. Há nos versos do poeta um lamento pelas vidas perdidas no mar, pelos amores interrompidos, e pela transitoriedade das grandezas humanas. Assim, Camões revela uma dimensão crítica, que vai além do ufanismo, e coloca o ser humano no centro das suas preocupações literárias, com seus anseios, tristezas e dilemas morais.

É inegável a influência de Camões na literatura de língua portuguesa e em outros escritores, que, ao longo dos séculos, beberam da fonte de sua poesia. Sua habilidade em mesclar o épico com o lírico, em transitar entre o sentimento amoroso e as grandes narrativas históricas, tornou sua obra um marco incontornável na história da literatura. Poemas como “Sete Anos de Pastor Jacob Servia”, “Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente” e tantos outros revelam sua capacidade de explorar a alma humana em suas múltiplas facetas.

Além de ser um poeta da pátria, Camões foi, em muitos sentidos, um poeta do mundo. Sua obra reflete uma abertura para o diverso, para o novo, algo que ele encontrou nas várias culturas com as quais teve contato durante sua vida. De Lisboa a Ceuta, da Índia a Moçambique, Camões se tornou um cidadão do império português, absorvendo diferentes visões de mundo que enriqueceram sua poesia. Seu diálogo com o clássico e o moderno, com o Ocidente e o Oriente, com o conhecido e o desconhecido, faz dele uma figura universal.

Assim, ao celebrar os 500 anos de seu nascimento, celebramos não apenas o autor de Os Lusíadas, mas também o homem que soube captar a essência de uma época de transformações globais, deixando um legado que transcende fronteiras e continua a ressoar. Camões permanece um dos maiores poetas da humanidade, e sua obra, uma janela para um Portugal de glórias, incertezas, desafios e conquistas, ainda inspira, questiona e emociona.

Que este quinto centenário seja uma oportunidade para revisitarmos a obra de Camões e para refletirmos sobre o valor da poesia em tempos de mudanças tão rápidas quanto as ondas do mar que ele tão bem soube descrever. Em um mundo que continua a navegar por mares desconhecidos, a poesia de Camões nos oferece um mapa para entendermos melhor o passado e o presente, guiando-nos com sua sensibilidade e sabedoria.