Valendo-se de um método novo, que passa até pela utilização de fotos aéreas do Google, o instituto concluiu que, no espaço em que a multidão se amontoou, não cabem mais de 875 mil pessoas
José Horta Manzano
A Agência Brasil contou, todo o mundo copiou. A manchete é bastante precisa: “Show de Madonna reúne 1,6 milhão de pessoas em Copacabana”. Se tivesse dito “reúne 1,6 milhão”, já estaria de bom tamanho, visto que todos entendem tratar-se de “pessoas”. Mas o manchetista achou que a exatidão vale mais que a imprecisão.
A mídia europeia, que consultei, não deixou a ocasião passar em branco. Repetiram todos a contagem expressiva: 1,6 milhão (de pessoas, naturalmente)! Afinal, estava ali a prova de que um dos shows de maior plateia do mundo tinha ocorrido nas areias de Copacabana.
Passada uma semana, o assunto já amornou embora seus ecos ainda surjam aqui e ali, em bate-papos de boteco. E não é que o Instituto Datafolha publicou neste sábado o resultado de uma pesquisa traiçoeira, que vai decepcionar muita gente.
Valendo-se de um método novo, que passa até pela utilização de fotos aéreas do Google, o instituto concluiu que, no espaço em que a multidão se amontoou, não cabem mais de 875 mil pessoas. Assim mesmo, apertando muito, com 7 pessoas por metro quadrado. 1,6 milhão? Nem por sonho. Pode esquecer.
Não estou sabendo se há alguma rixa pessoal entre os que fizeram esse estudo (875 mil) e os que fizeram a primeira contagem (1,6 milhão). Se não for isso, esse novo estudo deixa no ar um climão do tipo: “Erraram eles ou erramos nós?”.
A contagem “científica” do instituto tinha de ter saído bem mais rapidamente, no dia do show ou no dia seguinte. Hoje, passada uma semana, é tarde demais. A nova contagem não tem serventia.
Não acredito que o levantamento do Datafolha contribua para a serenidade da atmosfera nacional. Na verdade, não serve pra nada, a não ser como jogada de marketing em causa própria: “Vejam como somos fantásticos, nós! Sabemos contar melhor que vosmicês!”.
Num ambiente nacional de polarização sistemática de tudo o que se diz e de tudo o que se faz, melhor teria sido se tivessem calado.