Detido nos Emirados Árabes Unidos após ser acusado de crimes como estupro, agressão e sequestro, empresário desafiava mulheres a denunciá-lo: ‘Eu quero que vão todas. Todas. Sem exceção’
Por Nicolas Iory — O GLOBO – São Paulo
O empresário Thiago Brennand, que deve ser extraditado ao Brasil nos próximos dias após ter sido preso nos Emirados Árabes Unidos, desafiou uma mulher a denunciá-lo em áudios enviados em maio do ano passado. Em uma das conversas, Brennand minimizou o risco de vir a ser preso: “Vão me meter na cadeia, ó meu Deus”, afirmou, em tom jocoso.
A interlocutora de Brennand era uma mulher que havia sido alvo de um boletim de ocorrência registrado em 4 de maio pelo empresário, que a acusava de tê-lo difamado. Brennand relatou à polícia que a mulher, uma prostituta, teria se aliado a um ex-amigo para espalhar informações falsas a seu respeito e posteriormente extorqui-lo. A origem da queixa foi o fato de Brennand ter recebido áudios em que essa mulher conta a uma amiga que foi obrigada pelo empresário a ter relação sexual com ele sem o uso de preservativo.
Horas depois de ter registrado o B.O. contra a mulher, o próprio Brennand a procurou enviando foto do documento policial. “Não tenho telhado de vidro, e não tenho medo de grupinho querendo me prejudicar”, escreveu o empresário às 23h12 de 4 de maio de 2022. Já de madrugada, a mulher responde questionando qual crime ela teria cometido, no que Brennand se esquiva: “Não quero papo com você (…) seu assunto é com a polícia”. A mulher não se intimida: “Estou aguardando a intimação. Vou falar tudo sobre o abuso que eu sofri. Tchau”. Brennand respondeu com ofensas: “Puta burra, pobre e bandida. Lixo humano. Fale sim, não esqueça nenhum detalhe”.
No registro da ocorrência na delegacia, o empresário havia dito que “nunca teve nenhum contato desta natureza (sexual)” com a mulher que estava acusando. Depois, modulou o discurso. Em conversa por telefone em 5 de maio, dia seguinte ao registro do B.O., Brennand disse à mulher: “O seu relato já nasce morto porque você mesma diz que o sexo foi consentido, que só não consentiu com a camisinha. Você é tão burra…”. Na mesma ligação, a mulher afirma que saiu da casa do empresário “horrorizada”, no que ele responde: “Você saiu daqui minha amiga, você quis voltar outras vezes. Eu ia te ajudar, te dar outros trabalhos, cara”.
Brennand depois confirma ter dado R$ 3 mil à mulher, mas negou que tenha sido um pagamento por sexo. “Paguei para você vir aqui como eu pago sempre outras mulheres”, explicou-se.
A mulher acusada por Brennand relatou que se sentiu “presa, em cárcere privado” na casa do empresário, e que teve medo de contrariá-lo por causa da coleção de armas que ele ostenta no local. “Não quero teu dinheiro. Mas isso não muda o que aconteceu. Várias vezes eu disse: ‘não quero sem camisinha. Não quero’. E você não sabe o que é a palavra ‘não’”, declarou a mulher na ligação telefônica com o empresário.
Ela conta também que realizou exames nos dias seguintes à sua visita a Brennand e que usou uma pomada ginecológica por medo de ter contraído alguma doença sexualmente transmissível. Ao relatar isso ao empresário, ele respondeu: “Tu vai mostrar a tua pomada, nêgo vai dar risada. Teu exame? Nêgo vai dar risada. Tu acha que um homem como eu tem DST, rapaz? Eu me cuido, eu sei por onde eu circulo”. Em outro trecho, ele questiona: “Você acha que todos os operadores de direito aqui do Brasil é tudo trouxa? Não sabe o que é mulher golpista? Ainda mais puta golpista”.
‘Vítima de maldade’
A conversa depois prossegue em mensagens pelo WhatsApp. Em um dos áudios enviados por Brennand, ele disse ser vítima de uma “maldade” e exaltou seu suposto histórico na defesa das mulheres. “Eu defendi mulher a vida inteira contra criminoso, e você, a esta altura do campeonato, aos meus 42 anos, vem falar isso”.
Em outra gravação, o empresário minimiza a possibilidade de outras mulheres irem à Justiça contra ele: “Eu quero que vão todas. Todas. Sem exceção”.
As investigações sobre o alegado crime de difamação contra Brennand não foram adiante. O Ministério Público de São Paulo defendeu o arquivamento do inquérito policial em 25 de maio, alegando que Brennand apresentou “uma situação totalmente forçada” e que “tentou demonstrar eventual extorsão, sem, contudo, lograr êxito”. O pedido foi aceito pela Justiça paulista na mesma semana, em 30 de maio.
Alvo de cinco mandados de prisão preventiva, Brennand deixou o Brasil em 4 de setembro do ano passado com destino a Dubai. No mesmo dia, o MP-SP ofereceu denúncia à Justiça contra ele por ter agredido a atriz e empresária Helena Gomes em uma academia que funciona dentro de um shopping de luxo na capital paulista. A agressão ocorreu em agosto, poucos meses depois do caso da suposta difamação alegada por Brennand.