Luiz Felipe Pondé
Folha
Um espectro ronda o Brasil. O espectro da estupidez. A política, a direita e a esquerda, são miseráveis. Olhemos a política do ponto de vista da sua relação com as tecnologias de mídia. A impressão da Bíblia em língua vernácula foi uma das causas das guerras religiosas na Europa. O rádio foi essencial para os grandes movimentos fascistas no século 20.
As redes sociais desempenham papel semelhante agora. Cada vez que se amplia a inclusão da massa na circulação de ideias, uma das consequências é a entrada em cena de mais idiotas na dinâmica política.
EXCLUSIVO PARA BOBOS – A mídia específica “for dummies” (para bobos) são as redes sociais. A política atravessada pelas redes é a política “for dummies”. Desde as convocações a golpe pelos bolsonaristas até grupos de WhatsApp em que se trocam figurinhas do Lula com coraçãozinho se trata de política “for dummies”.
Há mais de dez anos o mundo festejava a ação das redes no que os inteligentinhos chamavam de “primavera árabe”. Inteligentinhos com diplomas foram à região auscultar os batimentos cardíacos na nascente democracia das redes no mundo árabe. Longos artigos foram escritos explicando o efeito libertador das redes na política.
Bom, a Primavera Árabe virou guerra civil na Síria e trouxe à tona o Estado Islâmico. A juventude das redes no Egito voltou às ruas para pedir ao Exército que derrubasse o governo legitimamente eleito (!!) —a Irmandade Muçulmana—, o que conseguiram com sucesso e alívio.
POR MEDO OU TESÃO – A Líbia virou um acampamento dominado por tribos esquecidas, a Tunísia — berço da Primavera Árabe — vive de susto em susto. Enfim, deu ruim. Onde estão as incríveis análises sobre as redes sociais e a democracia na Primavera Árabe? Inteligência “for dummies”?
Foram esquecidas pra sorte da inteligência pública que sempre fica babando, por medo ou por tesão, quando ouve falar em “movimentos populares”. O povo se movimenta como uma força enlouquecida da natureza. Nesse ponto, política e física se fazem uma só.
Em 2013, as Jornadas de Junho — a arruaça iniciada pelo movimento adolescente Passe Livre — chegaram a ser festejadas com uma mesa “urgente” na Flip para as inteligentinhas grã-finas se deliciarem com ícones ninjas da época.
QUE TESÃO! – Tudo era lindo nos mascarados quebrando as ruas. Mais uma enxurrada de textos eróticos sobre os movimentos populares sem liderança centralizada. Que tesão!
Pois é. As redes sociais trouxeram a estupidez popular para o seio da dinâmica política. Quando a estupidez popular combina com a minha, acho revolucionária, quando não combina, considero totalitária.
Os dois pesos e duas medidas que a inteligência pública tem aplicado aos “movimentos populares” se revelou uma faca de dois gumes.
MUNDO PÓS-MODERNO – Pois então. Os bolsonaristas golpistas acham que estão lutando pela democracia e que o Lula, junto com juízes amigos, roubou a democracia deles. Duro esse mundo pós-moderno feito de narrativas, não? Fofo ver revolucionários de bolso pedindo força policial maior, não?
A política sempre foi o território da violência, das utopias idiotas, das mentiras, da corrupção, e, com as redes sociais, dos imbecis que alçaram ao lugar de fala pleno. Melhor seria para o mundo se as redes sociais fossem simplesmente destruídas. Os imbecis voltariam à vidinha de sempre. O manto da irrelevância cobriria seu cotidiano. A democracia continuaria a usufruir da estabilidade que traz o silêncio social.
As redes sociais não fizeram as pessoas mais “informadas”, fizeram as pessoas mais ignorantes da sua ignorância. Mas eu deliro: as redes sociais são o capitalismo hoje e, mesmo que elas destruam o mundo, continuarão de vento em popa.
AGRADEÇAM A BOLSONARO – As redes corroem a credibilidade institucional no mundo. Petistas deveriam agradecer a Bolsonaro.
Este deu para aqueles a chance de reorganizar sua gangue com o dinheiro público. E mais: sequestrar a ideia de democracia para suas pautas.
A criação da Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia para combater a desinformação será uma NKVD light —a Gestapo stalinista— para calar quem não lamber as botas deles. O poder adora puxa-sacos.