Em decisão liminar, ministra Rosa Weber ataca com dureza a portaria do Temer que muda normas para caracterizar o que é ou não uma atividade análoga à escravidão

A portaria do Ministério do Trabalho diz, entre outros pontos, que seria preciso ocorrer a privação do direito de ir vir para que fosse identificado o trabalho forçado, a jornada exaustiva e a condição degradante, algo que no Código Penal não é obrigatório. A portaria deixa também nas mãos do ministro do Trabalho — e não mais da equipe técnica — a inclusão de nomes na chamada “lista suja”, que reúne empresas flagradas explorando trabalhadores em condições análogas à escravidão.
Para Weber, o Governo Temer “introduz, sem qualquer base legal de legitimação, o isolamento geográfico como elemento necessário à configuração de hipótese de cerceamento do uso de meios de transporte pelo trabalhador, e a presença de segurança armada, como requisito da caracterização da retenção coercitiva do trabalhador no local de trabalho em razão de dívida contraída”. Ela também recorda que a portaria se omite “quanto à conduta, tipificada na legislação penal, de restringir, por qualquer meio, a locomoção de alguém em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”.
A ministra argumenta ainda que a portaria adota “conceitos tecnicamente frágeis” e “ambíguos” ao definir o conceito de trabalho forçado como aquele “aquele exercido sem o consentimento por parte do trabalhador” ou quando este não tem a “possibilidade de expressar sua vontade”. Diz ainda que a portaria “opera verdadeiro esvaziamento do conceito” (trabalho escravo) ao atribuir “à expressão jornada exaustiva” o significado de “jornada excessiva em extensão ou intensidade”.

A portaria foi publicada na semana passada pelo Governo Temer para atender demandas antigas da bancada ruralista, às vésperas da votação da segunda denúncia contra o presidente na Câmara dos Deputados. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) chegou a declarar que o Brasil deixava de ser referência no combate ao trabalho escravo e vira exemplo negativo. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também defenderam a revogação imediata do documento.