por Silvia Bessa e Juliana Colares
É a dor da ausência paterna acalantada por uma gravação de voz em fita cassete. É o menino de cinco anos que, de tanto esperar um reencontro, duvida se a imagem do homem vista à distância é a do seu pai. É a história ignorada pelos livros didáticos, subestimada pelas Comissões da Verdade estaduais. E pela imprensa. É o Golpe Militar de 1964 no Brasil pelo viés dos filhos. Testemunhos pessoais, documentos orais de bastidores do antes, durante e depois do dia 31 de março de 50 anos atrás.
É a narrativa do filho que guarda cobertores usados pelo pai durante anos de prisão; do outro que chora ao lembrar o momento em que avistou o irmão levantar um lençol encharcado de sangue e viu o pai, morto. Do filho que ri ao lembrar que omitia a profissão do pai; do que crê ter apagado parte da lembrança para se poupar. É a memória de um coletivo que pouco se ouve.
Em depoimentos gravados em Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, dez filhos fazem confidências sobre si, os pais, a vida doméstica. Relatam o impacto do golpe nas relações individuais e familiares dos Arraes, Freire, Capistrano, Julião, Régis, Rolemberg, Vilarinho Amaral, Soares, Cruz, Silveira. Revelam fragmentos de um passado e de um presente de Pernambuco durante o governo militar (1964/1985). São filhos de presos políticos, de desaparecidos, mortos, militantes da esquerda, governantes depostos dos seus cargos, de um civil morto e de um militar. Eles descrevem episódios e externam sentimentos em torno da ditadura que se instaurou no Brasil há apenas 50 anos, e de cujas repercussões ainda não se dimensiona.










