Ao reparar esse comportamento, ele percebeu que elas não estavam em redes sociais como Facebook, Twitter ou Instagram, mas no Whatsapp, aplicativo multiplataforma que permite trocar mensagens pelo celular sem pagar por SMS. Não demorou muito e Gusmão resolveu usar esta ferramenta como uma ponte entre o jornal e seus leitores.
“É diferente de outros canais, mesmo redes sociais, nos quais você está próximo do leitor, mas nem tanto. No Whatsapp ele tem um número direto [do jornal] para fazer denúncia, criticar, elogiar, mandar pauta. É o jornalismo colaborativo na sua melhor essência. O trem quebrou? Ele manda. O trânsito tá ruim? Ele manda. Denúncia de tráfico de drogas? Ele manda”.
A ideia, posta em prática em 24 de junho de 2013, dia de manifestações pelo país, vingou.
Falhas e
más condições do transporte público; falta de água, de luz e da coleta de lixo;
acidentes;
ruas alagadas;
explosão de bueiros;
protestos; e outras cenas ganharam espaço na publicação. “As pessoas querem colaborar. “Olha aqui como está minha rua!”. Eles ajudam a mostrar o que não conseguimos. São nossos olhos. Buscamos histórias e apuramos”, afirma Gusmão.
Em oito meses e meio, o número (21 99644-1263) registrou cerca de 30 mil fotos, 400 áudios, 600 vídeos, em mais de 400 mil mensagens enviadas por mais de 12 mil contatos. Mas, apesar do conteúdo útil, o jornal já recebeu muitas piadas e imagens obscenas. “Mas não restringimos, porque todos podem ser potenciais colaboradores”, explica. Para filtrar e responder a tantos contatos, a redação do jornal faz um rodízio, do qual participam repórteres, editores e chefia de reportagem.
Crédito:Rafael Moraes
Segudo Gusmão (foto), o conteúdo exclusivo e recebido em tempo praticamente real refletiu em audiência para a publicação
“É a bola da vez. Permite, de fato, a tão buscada interatividade, o jornalismo participativo. Quem participa das redes criadas a partir do Whatsapp oferece o que tem de mais pessoal, que é o seu número no celular”, explica Bruno Thys, diretor geral do Sistema Globo de Rádio.
Ao ver o resultado do uso do WhatsApp no Extra, Thys convidou Gusmão para dar uma palestra sobre o assunto. “Ele entende que a tecnologia não é fim, mas meio. E tem conseguido usar a tecnologia para alavancar o conteúdo jornalístico”, afirma. Após a palestra, a CBN Rio passou a usar o aplicativo (21 99764-2371) com “ótimos resultados”.
Além da rádio, outros veículos adotaram o uso do aplicativo, como os jornais A Tarde e Correio, da Bahia, a Band do Rio de Janeiro e, recentemente, a Folha de S.Paulo, que estreou seu canal no dia 10 de março.
“Percebemos que essa ferramenta poderia nos ajudar na confecção do produto jornalístico”, explica Roberto Dias, secretário assistente de redação da Folha. Poucas horas após a divulgação do número (11 99490-1649), o jornal recebeu mais de mil mensagens do Brasil e do exterior.
Dias, que participou do processo desde o início, no final de 2013, conta que a ideia foi coletiva da redação. Apesar do pouco tempo de uso, a avaliação já é positiva. “Recebemos muitas coisas interessantes, mas precisamos filtrar. Meu feeling é que vai ser muito útil, principalmente em protestos, manifestações”, afirma. Por enquanto, quem filtra, responde e encaminha as mensagens quando necessário é a editoria de mídias sociais da publicação.
Crédito:Reprodução/Folha
Exemplos de mensagens recebidas pelo jornal
O jornalista Thomás Milhazes, um dos responsáveis pelo site da Band do Rio de Janeiro, conta que a equipe do veículo gostou bastante da novidade, adotada há cerca de dois meses após iniciativa do Rodolfo Schneider, diretor de jornalismo. “Chegam informações boas, muitas denúncias que já levamos para o jornal [todos da casa, principalmente o Brasil Urgente]”, explica. Segundo ele, que filtra e direciona boa parte das mensagens, 700 pessoas já entraram em contato.
Longe do sudeste brasileiro, na Bahia, o grupo A Tarde e o jornal Correio também aderiram ao aplicativo. Em janeiro, durante celebração do Senhor do Bonfim, A Tarde divulgou o número (71 7196-0020) como parte do “Cidadão Repórter”. “A ideia era usar eventualmente pelo receio da demanda ser muito grande. Mas resolvemos adotar por ser uma ferramenta que dá agilidade na interação com a audiência”, diz Iloma Sales, editora coordenadora de Mídias Digitais.
A ferramenta é utilizada, principalmente, para flagrante de notícias do dia a dia da cidade, como trânsito, acidentes e incêndios. “Tem funcionado muito bem. Às vezes, não sabemos nem com quem estamos falando, mas começamos o diálogo. A partir daí, a apuração segue normal”, afirma.
Crédito:Iloma Sales
Versão para desktop facilita leitura das mensagens
Com mais de 200 usuários cadastrados, além de grupos que acompanham assuntos como trânsito, o veículo utiliza a versão desktop para facilitar a leitura. “A informação chega de todos os lados. Fazemos três, quatro notas por dia e tem coisas que rendem reportagens”, comenta.
A ideia veio do Vaguinaldo Marinheiro, ex-diretor de redação, função que exerceu por quase três anos. Segundo a profissional, todos gostaram da ideia e a equipe, assim como ela, acham a experiência fantástica. “Melhorou bastante em termos de produção e de conteúdo porque estamos recebendo informações de forma mais rápida e interativa”, ressalta.
O Correio, que também divulgou seu número (71 8791-3888), acredita que o aplicativo permite uma “conversa mesmo” com o leitor. “Já usávamos as redes sociais tradicionais (Facebook, Twitter e Instagram), ótimas em termos de acesso e de interação, mas com o WhatsApp criamos um canal absolutamente direto”, conta o editor Wladmir Pinheiro.
Desde meados de janeiro, a publicação já recebeu mais de 30 mil mensagens, entre fotos, vídeos e textos com denúncias e sugestões de pauta. “O WhatsApp é muito mais quente, atualiza em tempo real. Hoje mesmo, em 10 minutos, três pessoas diferentes entraram em contato sobre um acidente. Uma informou, uma mandou foto e um funcionário da empresa envolvida passou informações. A participação é muito forte, sobretudo no cotidiano da cidade: trânsito, acidente, lixo…”, diz Pinheiro.
Crédito:Reprodução – Foto do Leitor/Correio24Horas
Flagrante de acidente foi enviado pelo WhatsApp
Além dos factuais do dia a dia, algumas denúncias viraram reportagens, com desdobramentos. “Essa semana uma ambulância do governo foi flagrada transportando uma travesti numa área de prostituição. O funcionário foi afastado por desvio de conduta”, exemplifica. Na publicação, todos checam as mensagens do aplicativo, mas em cada turno há um repórter responsável por filtrar as informações e responder. “Abrimos uma porta gigantesca para o leitor”, finaliza.
fonte:PI