Sucessão precipitada

por  José Dirceu

A ainda distante, a sucessão presidencial de 2014 já ocupa boa parte do noticiário político brasileiro. O curioso é que essa antecipação é atribuída a ações do governo federal, quando ela é claramente fruto de uma estratégia deliberada dos líderes da oposição e da grande mídia, com o objetivo de tentar prejudicar a reeleição da presidenta, Dilma Rousseff.

Ou seja, a oposição e a mídia antecipam o debate sucessório, jogam essa responsabilidade sobre o governo federal, cinicamente, e ainda tentam faturar criticando Dilma pela situação que eles mesmos criaram.

Basta ler os jornais com um mínimo de senso crítico. Dos quatro principais nomes citados como possíveis candidatos à Presidência da República em 2014 — Dilma (PT), Aécio Neves (PSDB), Marina Silva (Rede) e Eduardo Campos (PSB) –, dois foram agraciados com uma coluna semanal em um grande jornal.

Aécio e Marina, que mantêm sua condição de colunistas sob a justificativa de que “oficialmente” ainda não são candidatos a nada, sem qualquer constrangimento usam esse espaço para propagandear seu discurso eleitoral.

Vamos a alguns exemplos. Aécio escreveu recentemente em sua coluna: “Quem, afinal, imaginaria o PT defendendo o casuísmo de uma revisão legislativa para impedir a formação de novos partidos e, assim, cassar adversários diretos da futura disputa presidencial?”.

Marina Silva não ficou atrás: escreveu que “o governo queria prejudicar a formação de partidos que não estarão na sua base”, mas “o STF ouviu o apelo dos que resistiam e interrompeu o golpe”.

Colunas desse teor são publicadas a poucas páginas de distância de reportagens em que os mesmos pré-candidatos aparecem dizendo as mesmas coisas. É propaganda eleitoral antecipada disfarçada de colunismo — muito mal disfarçada, por sinal.

Até porque os péssimos argumentos apresentados pelos dois assumidos pré-candidatos também estão presentes em editoriais e reportagens tendenciosas da mesma imprensa que lhes abre tantos espaços.

A maior parte dessas reportagens se refere ao mesmo assunto comentado por Aécio e Marina para atacar o governo — o projeto de lei do deputado Edinho Araújo (PMDB-SP), que impede a transferência do tempo de rádio e TV e de recursos do fundo partidário dos parlamentares que mudarem de sigla no decurso do mandato. Apenas isso.

A proposta não restringe a criação de novas legendas, o que depende exclusivamente do apoio de 500 mil eleitores. Mas os jornais, sem nenhum fundamento além das convenientemente ocultas fontes de “bastidor”, escrevem com todas as letras que o projeto é patrocinado pelo governo federal com o objetivo de prejudicar as candidaturas de Marina e de Eduardo Campos — e também de Aécio, por tabela, pois um menor número de concorrentes dificulta que a eleição seja levada para o segundo turno.

Ora, como o governo federal poderia estar por trás de um projeto que foi proposto em 2012, quando a Rede, de Marina, e o MD (Mobilização Democrática), que pode apoiar Campos, não existiam nem como possibilidade? Mais importante ainda: por que nas reportagens jamais é citada a informação de que o projeto “casuístico”, na verdade, é do ano passado?

E por que os jornais não tentam explicar o fato de um notório oposicionista, o deputado Ronaldo Caiado (DEM), ser o proponente da emenda que redefine os tempos de TV? Talvez, porque isso levaria a tese do “patrocínio do Planalto” ruir por completo — levando junto, ladeira abaixo, o discurso desesperado dos candidatos da oposição.

Em nenhum momento também mencionam que foi o Supremo Tribunal Federal (STF) quem alterou as regras do jogo, possibilitando ao PSD, quando da sua criação, carregar consigo o tempo de TV proporcional à sua bancada, reintroduzindo a motivação para a migração e contradizendo a decisão que impôs a fidelidade partidária.

Assim, o projeto do deputado Edinho Araújo pretende apenas eliminar essa distorção que, na prática, criou um verdadeiro mercado aberto de mandatos e partidos de aluguel.

Quem antecipou o debate da sucessão presidencial foram a oposição e a imprensa. A presidenta Dilma continua apenas fazendo seu trabalho. E essa é justamente a maior ameaça para aqueles que plantam a confusão no noticiário político, sonhando em colher dividendos para suas candidaturas sem rumo e sem projeto alternativo.

Pela insistência com que voltam à carga e pela inconsistência do discurso e dos debates que levantam fica evidente que a estratégia não está funcionando — infelizmente para eles, mas felizmente para o Brasil.

 José Dirceu, 67, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT.