Ricardo Noblat
Se comprado apenas pelo que diz para divulgação, até que Lula parece bonzinho quando quer.
Lula quis parecer bonzinho em Fortaleza, na semana passada, ao responder perguntas sobre a hipótese de o PSB lançar Eduardo Campos, atual governador de Pernambuco, para concorrer à sucessão de Dilma em 2014. “Não podemos impedir as pessoas de fazerem o que é do interesse dos partidos”, disse Lula, o cordato.
Foi adiante: “Defendo a liberdade incondicional de cada partido de fazer o que bem entenda. Se não fosse assim, o PT não teria chegado à presidência da República. Portanto, eu jamais tomaria qualquer atitude para impedir que um companheiro fosse candidato a presidente”.
Do alto de sua experiência, sugeriu, bondoso: “O ideal é que a gente consolide as forças que estão mudando este país”.
Por fim, elogiou o próprio Eduardo: “Ele é uma personalidade que pode desejar qualquer coisa que ele quiser neste país. O meu papel é fazer todo o esforço para que a gente esteja junto. Temos que construir uma aliança muito forte”.
Eduardo apoiou Lula em quase todas as eleições presidenciais disputadas por ele. Lula só apoiou Eduardo para que ele se reelegesse governador.
No ano passado, Lula e Eduardo haviam combinado que o deputado Maurício Rands, do PT, seria o candidato dos dois a prefeito do Recife. O PT controlava a prefeitura há 12 anos.
Um dia, Eduardo ficou sabendo que Lula tinha entrevista marcada em uma emissora de rádio para anunciar a candidatura a prefeito do senador Humberto Costa (PT). Foi nessa ocasião que a boa relação entre os dois começou a ir para o buraco.
“Presidente, estou lhe telefonando da sala onde meu avô foi preso”, começou a dizer Eduardo de uma das salas do palácio do Campo das Princesas, sede do governo de Pernambuco. Dali, no dia 31 de março de 1964, Miguel Arraes, governador do Estado, foi retirado sob a mira de metralhadoras. Os oficiais do Exército que o prenderam exigiram que renunciasse ao mandato. Arraes respondeu que jamais o faria.
Ao terminar de narrar o episódio a Lula, e de discutir a candidatura de Humberto, Eduardo acrescentou: “Não renuncio ao meu cargo. E ele me obriga a fazer o que for melhor para Recife e Pernambuco”.
Lula ainda tentou negar que tivesse alguma entrevista marcada para anunciar o nome do novo candidato do PT a prefeito do Recife. A conversa que começara formal terminou azeda. Eduardo atraiu todos os partidos que apoiavam o PT e elegeu um prefeito do PSB.
Desde então, ele e Lula nunca mais se viram ou se falaram.
À Dilma, recentemente, Eduardo disse que somente no próximo ano o PSB se posicionará sobre a eleição presidencial. Adiantou que o partido tende a disputar a eleição com candidato próprio, mas que não poderia garantir que o fará.
Dilma foi hábil. E renovou seu desejo de contar com o apoio do PSB – seja no primeiro ou num eventual segundo turno.
De lá para cá tudo desandou.
O PT apertou Lula para que ele apertasse Eduardo. Lula apertou os irmãos Gomes (Cid, governador do Ceará, e Ciro) para que eles ameaçassem rachar o PSB.
Sem candidato forte ao governo de Pernambuco, o PT acenou para Fernando Bezerra Coelho, ministro da Integração Nacional por indicação de Eduardo. Fernando lançou uma nota de quatro linhas negando o aceno.
Eduardo sabe que Fernando quer sucedê-lo. E que poderá aderir ao PT.
Em 1986, então secretário de Estado do governo Roberto Magalhães, do PDS, Fernando largou o cargo para apoiar Arraes, candidato a governador pelo PSB. Em 2002, mudou-se para o PMDB e apoiou Jarbas Vasconcelos, que quatro anos antes vencera Arraes. Finalmente, em 2006, voltou ao PSB para apoiar Eduardo, candidato ao governo.
A ofensiva do PT contra Eduardo põe em risco duas condições essenciais à consolidação da candidatura dele a presidente: a unidade do PSB e a unidade das principais correntes políticas de Pernambuco.
Caso Fernando acabe no PT para disputar o governo, sua candidatura subtrairá parte da força da ampla coligação partidária que sustenta a ambição presidencial de Eduardo. Lula sabe disso. E por saber…
Marina Silva será candidata a presidente? Ela não é da base de apoio a Dilma. Não lhe tira votos.
Eduardo é da base de apoio e tira votos de Dilma. De resto, desmancha o cenário considerado ideal por Lula para ganhar outra vez: PT, apoiado por um monte de partidos x PSDB quase só.
Eduardo deixaria a base do governo na companhia de outros partidos. Nenhum partido parece disposto a trocar Dilma por Aécio.
Eduardo mete muito medo no PT. A pecha de direitista, privatista e anti-Lula não gruda nele. É preciso, portanto, sufocá-lo logo de saída. Todas as armas serão usadas para isso.