Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc – A cultura, em sua essência, é o espírito que anima uma sociedade. Ela é mais que a música que escutamos, os livros que lemos ou as tradições que carregamos; é a bússola que orienta a humanidade em sua jornada pela história. Não é à toa que grandes pensadores e líderes, ao longo dos séculos, exaltaram a importância da cultura enquanto governos autoritários a temeram. A cultura liberta, provoca, desafia. E a liberdade que ela oferece é apavorante para qualquer regime que dependa do controle e da ignorância para sobreviver.
“Sem cultura, e a liberdade relativa que ela implica, a sociedade, mesmo bem equipada, não passa de uma selva.” As palavras do filósofo Albert Camus nos ajudam a compreender por que a cultura é tão temida por sistemas autoritários. Ela é um espaço de questionamento e renovação, um campo fértil para a transformação. A história está repleta de exemplos de líderes que tentaram silenciar a cultura e a educação, desde a queima de livros na Alemanha nazista até a censura das artes em regimes ditatoriais na América Latina. Esses atos não eram apenas ataques a objetos ou expressões artísticas, mas tentativas de aniquilar o pensamento crítico, de silenciar as vozes que podiam despertar o povo.
O livro é, talvez, o maior símbolo do poder transformador da cultura. Ele registra ideias, memórias e sonhos; é capaz de atravessar o tempo e o espaço, carregando consigo a sabedoria de gerações. “Se você quer destruir um povo, comece destruindo sua cultura”, afirmou Milan Kundera, ressaltando o papel central da literatura na construção de uma identidade coletiva.
A leitura, como um ato individual e silencioso, é também profundamente revolucionária. Ela amplia horizontes, quebra barreiras e dá ao indivíduo o poder de questionar. É por isso que governos autoritários têm medo dos livros. Eles sabem que, ao abrir um livro, um indivíduo pode começar a desconstruir as mentiras e opressões que o cercam.
“A liberdade é sempre e exclusivamente liberdade para quem pensa de maneira diferente”, disse Rosa Luxemburgo. A cultura ensina a pensar de maneira diferente, a enxergar o mundo por meio de lentes múltiplas e a questionar verdades absolutas. Governos autoritários temem a cultura porque ela educa o povo, e um povo educado é um povo difícil de controlar.
A sabotagem da cultura, da educação e das artes não é um ato de ignorância, mas uma estratégia calculada. Um povo sem acesso à cultura é mais fácil de manipular, menos propenso a se rebelar contra as injustiças. Assim, ditadores tentam apagar a memória coletiva, sufocar as artes e desencorajar o pensamento crítico. Mas, como escreveu o poeta Ferreira Gullar, “a arte existe porque a vida não basta”. E a cultura, sendo a expressão mais profunda da humanidade, sempre encontra formas de resistir.
Um povo sem cultura é como um barco à deriva, sem rumo, sem identidade. A ausência de cultura não é apenas uma lacuna intelectual, mas uma ferida que corrói a alma de uma sociedade. É na cultura que encontramos nossas raízes, nosso senso de pertencimento e nossa capacidade de sonhar com um futuro melhor. Sem ela, somos reduzidos à sobrevivência, sem aspirações nem humanidade.
O autor Victor Hugo dizia que “abrir uma escola é fechar uma prisão”. Em uma sociedade em que a cultura é valorizada, há menos espaço para o medo, para a opressão e para o silêncio. A cultura é, portanto, não apenas um direito, mas uma necessidade.
Construir uma sociedade que valorize a cultura é uma tarefa árdua, mas essencial. Isso exige não apenas políticas públicas que incentivem a produção cultural, mas também uma mobilização coletiva para preservar e celebrar as expressões artísticas e literárias que nos definem.
A cultura é a prova de que somos mais que números, mais que engrenagens de uma máquina. Ela é o testemunho de nossa humanidade e de nossa capacidade de criar e transformar o mundo ao nosso redor. E se um povo sem cultura é um povo sem rumo, um povo com cultura é uma força imbatível, capaz de reescrever sua própria história.
O que faríamos sem a cultura? Seríamos sombras, vagando por um mundo sem cores, sem música, sem significado. É na cultura que encontramos a verdadeira liberdade, e é por isso que devemos protegê-la com todas as nossas forças. Pois, como dizia Nelson Mandela, “a educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”. E a cultura, sendo a expressão mais pura dessa educação, é o grito de liberdade que nenhum tirano pode calar.