Fundador do WikiLeaks se casa com sua ex-advogada na prisão

Assange e Moris tiveram dois filhos em segredo durante os quase sete anos que o australiano viveu refugiado na embaixada equatoriana

Richard Assange (3L), pai do fundador do WikiLeaks Julian Assange, caminha com a parceira de seu filho Stella Moris (C) ao sair da prisão de Belmarsh em Londres, em 23 de março de 2022
Richard Assange (3L), pai do fundador do WikiLeaks Julian Assange, caminha com a parceira de seu filho Stella Moris (C) ao sair da prisão de Belmarsh em Londres, em 23 de março de 2022 – Foto: Justin Tallis / AFP
O australiano Julian Assange e sua noiva, a advogada sul-africana Stella Moris, se casaram nesta quarta-feira (23) na penitenciária britânica de segurança máxima onde o fundador do WikiLeaks está desde sua detenção, em 2019, na embaixada equatoriana em Londres.

“Não sei o que dizer, estou muito feliz, estou muito triste, te amo Julian, com todo o meu coração e gostaria que estivesse aqui”, disse Moris com lágrimas nos olhos após o fim da cerimônia na prisão de Belmarsh, ao sul da capital.

Dezenas de seguidores esperavam por ela com confete em frente ao local, onde esta jovem advogada que se uniu à defesa de Assange em 2011 cortou um bolo de casamento.

O véu de seu vestido cinza prateado, desenhado pela britânica Vivienne Westwood, que há anos apoia a causa de Assange, tinha palavras bordadas como “livre”, “tumultuoso”, “nobre”. A lendária estilista punk de 80 anos também desenhou um kilt escocês para o noivo, em homenagem aos seus ancestrais escoceses.

Assange, de 50 anos, tenta por todos os meios não ser extraditado para os Estados Unidos, que querem julgá-lo pela publicação de centenas de milhares de documentos secretos, incluindo muitos que revelaram os abusos cometidos pelos militares americanos no Iraque e no Afeganistão.

Na semana passada, a Suprema Corte britânica negou a possibilidade de recorrer da extradição, sobre a qual a ministra do Interior, Priti Patel, tem agora a última palavra.

Assange e Moris tiveram dois filhos em segredo durante os quase sete anos que o australiano viveu refugiado na embaixada equatoriana, onde ele foi preso em abril de 2019, quando o presidente Lenín Moreno retirou a proteção concedida a ele em 2012 por seu antecessor Rafael Correia.

Nesta quarta-feira, os dois pequenos chegaram à prisão acompanhando sua mãe, também vestidos com trajes escoceses.

“Luta pela liberdade de imprensa”

Um funcionário do registro civil realizou o casamento e apenas quatro convidados e duas testemunhas puderam comparecer à cerimônia.

Moris denunciou que as autoridades prisionais rejeitaram as testemunhas propostas – jornalistas – e o fotógrafo – que também trabalha para a imprensa -, apesar da presença em “caráter privado”.

“Querem que Julian permaneça invisível para o público a todo custo, mesmo no dia de seu casamento, e especialmente no dia do seu casamento”, escreveu em um artigo publicado pelo The Guardian, comparando essa “lógica de fazer uma pessoa desaparecer na esperança de que seja esquecida como o que a Rússia soviética fazia”.

Mas os apoiadores que se deslocaram para as portas do Belmarsh não estavam dispostos a esquecer.

“Um casamento deve ser uma celebração, mas neste caso, não é”, disse à AFP Maureen Lambert, uma londrina de 76 anos, erguendo cartazes que diziam “O jornalismo não é um crime”.

Assange se tornou um cavalo de batalha dos defensores da liberdade de imprensa, que acusam Washington de tentar suprimir informações de segurança relevantes. Mas as autoridades americanas dizem que ele não é jornalista, e sim um hacker que colocou em risco a vida de muitos informantes ao publicar os documentos completos sem primeiro editá-los.

“Nós o homenageamos pelo seu valor e integridade, mas a batalha pela liberdade de Julian sempre foi muito mais do que a perseguição de um editor”, afirmou, entre os manifestantes, o jornalista americano Chris Hedges, vencedor de um Pulitzer.

“É a luta mais importante da nossa época pela liberdade de imprensa e, se perdermos, será devastador não só para Julian e sua família, como também para nós”, acrescentou.

Se condenado por espionagem nos Estados Unidos, Assange pode receber uma sentença de 175 anos de prisão.

Sua defesa, coordenada pelo ex-juiz espanhol Baltasar Garzón, argumentou que ele poderia cometer suicídio se exposto ao sistema prisional americano. E a princípio conseguiu que a justiça britânica lhe desse razão, impedindo a extradição.

Mas o Executivo americano apelou e convenceu os juízes de que Assange seria mantido em boas condições, com tratamento psicológico adequado, obtendo o aval para sua entrega.