Conheça a cidade onde é feita a vacina Sputnik V

 

Por Fernando Castilho*

Zelenograd. No ocidente, certamente, poucas pessoas já ouviram falar dessa cidade distante a 37 quilômetros de Moscou. Ela é o menor distrito da região que gravita ao redor da capital soviética, mas ainda assim, uma das 100 maiores cidades da Rússia.

Mas Zelenograd virou uma referência para a pandemia do coronavírus, por abrigar a planta industrial da Binnopharm, onde é fabricada a Sputnik V, a primeira vacina colocada pronta no mercado.

Foi na planta da Binnopharm, em Zelenograd, que a Sputnik V começou a ser produzida, depois que o Instituto de Pesquisa Cientíca Gamaleya concluiu os estudos pré-clínicos da amostra experimental de uma das vacinas contra o coronavírus.

Ela produz o chamado Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) e, também, a vacina na formulação final que é aplicada na população.

A fábrica da Binnopharm, em Zelenograd, faz parte do grupo farmacêutico russo Alium Sistema e é uma unidade de produção biofarmacêutica de ciclo vertical completo.

Ele ocupa uma área de 32 mil m². Antes da Sputnik V, o principal produto da Binnopharm era a Regevac, uma vacina contra hepatite B desenvolvida pela empresa.

A Sputnik V foi primeira vacina de coronavírus do mundo, mas foi recebida com desconfiança pelo mundo científico ocidental por não divulgar detalhes técnicos de seu desenvolvimento. Só este mês, depois do primeiro artigo científico publicado na revista internacional The Lancet, vieram mais informações sobre ela.

E, como a maioria dos produtos da indústria farmacêutica russa, sofre de preconceito sobre sua pesquisa e processos de produção, especialmente na Europa e Estados Unidos.

Entretanto, no Oriente Médio e países vizinhos à antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), a nova indústria farmacêutica russa é quem domina o mercado, pelo dinamismo de Moscou e outras grandes cidades da Rússia, depois que empresas privadas passaram a ser financiadas pelo governo e pelo Fundo Russo de Investimentos Diretos (FRID). Essa megacorporação foi criada pelo Governo Putin para bancar financiamentos que vão de estradas a medicamentos.

O Grupo Alium Sistema – que é dono da Binnopharm, que fabrica a Sputnik V – é uma holding farmacêutica apoiada pelo fundo. Ele foi criado por meio da fusão da Binnopharm com a OBL Pharm, uma das farmacêuticas líderes russas constituída a partir do apoio do fundo russo.

O fundo, por sua vez, é parceiro dos Fundos de Investimento Russo-Chinês e uma série de outros veículos de investimentos do Oriente Médio e Leste Europeu. A área de produção de fármacos da Alium Sistema ocupa um quarto de todas as instalações de alta tecnologia da região de Moscou.

Isso explica porque, assim que o Instituto Gamaleya fechou a pesquisa da Sputnik V, a Binnopharm, junto a sua fábrica pôde iniciar imediatamente a produção, fechando uma cadeia produtiva que vai da fábrica de vidros a seringas e embalagens.

E porque, enquanto isso acontecia, os diretores do FRID cuidavam de fechar os contratos de entrega em vários países, garantindo entrega rápida e sem as exigências contratuais das indústrias americanas como a Pfizer e a Moderna.

O problema da Sputnik V é que o mundo acadêmico ocidental não tem o volume de informações sobre sua pesquisa clínica como as demais vacinas, com dezenas de artigos publicados. A própria Anvisa, no Brasil, tem restrições e se queixa da falta de informações científicas em revistas internacionais.

Um desses entraves é que quem se apresenta como o vendedor no Brasil é o representante do FRID. Foi ele quem fechou a parceria com a empresa brasileira União Química que já tem sua fábrica pronta para processar as vacinas russas assim que receber o IFA da unidade de Zelenograd.

Além disso, a Sputnik V está no centro de um debate no Congresso pela liberação, pela Anvisa, sem que seja analisada no Brasil ou ter a chancela de ao menos uma das grandes agências reguladoras internacionais, além da própria agência russa.

A Sputnik V, que é uma vacina russa baseada no vetor de adenovírus e foi registrada pelo Ministério da Saúde da Rússia em 11 de agosto de 2020, e se tornou a primeira vacina contra o novo coronavírus SARS-COV-2 no mercado.

Desenvolvida pelo Centro Nacional de Pesquisa em Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya, os ensaios clínicos de Fase 1 e 2 foram concluídos em 1º de agosto e os ensaios clínicos pós-registro foram testados em mais de 40 mil pessoas.

*Jornalista. Titular da coluna JC Negócios, do Jornal do Commercio.