Panfletos distorcem frase de Marília Arraes sobre a Bíblia

 

Folha de São Paulo

São enganosos os panfletos e posts afirmando que a deputada federal Marília Arraes (PT), candidata à Prefeitura do Recife, quis proibir a leitura da Bíblia nas sessões da Câmara dos Vereadores da capital pernambucana quando era vereadora. Os materiais, verificados pelo Comprova, alegam que “cristão de verdade” não vota na petista e estampam um trecho de uma fala da candidata retirada de contexto.

Os conteúdos verificados dão a entender que a petista seria contra a Bíblia, mas escondem que a frase destacada envolvia uma defesa do estado laico e não uma ação anti-Bíblia.

A frase de Marília que aparece no panfleto é a seguinte: “Inclusive, na edição do novo regimento, me posicionei contra se manter o costume de se ler passagens da Bíblia e se falar em nome de Deus”. A candidata fez essa declaração em 2017, em entrevista à Folha de Pernambuco, ao comentar a decisão do Ministério Público de Pernambuco de recomendar a proibição de práticas religiosas na Câmara.

Os panfletos não são assinados e, após um pedido da candidata, a Justiça Eleitoral determinou que eles não fossem mais distribuídos.

O site do PT, partido da candidata, publicou um texto afirmando ser falso que Marília seja contra a Bíblia e os cristãos. O Comprova procurou a assessoria de imprensa da candidata, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

SEM AUTORIA

Os panfletos não possuem assinatura. A candidatura de Marília Arraes apresentou uma representação à Justiça Eleitoral para impedir a circulação desses panfletos e informou que eles estariam sendo entregues em frente a uma igreja no dia 22 de novembro. A defesa da candidata alegou que a campanha do adversário João Campos (PSB) “foi responsável pela confecção e patrocínio da entrega do material, pois os adesivos colados no carro utilizado na distribuição e o material elogioso do candidato entregue com a publicidade combatida apresentam design típico de sua campanha impresso em alta qualidade”.

Na decisão, a juíza da 7ª Zona Eleitoral de Recife, Virgínia Gondim Dantas, deferiu liminar em favor da candidata petista proibindo a distribuição do material e acolheu o argumento da coligação que sustentava se tratar de propaganda irregular, ao dizer que a distribuição dos materiais impressos foi “levada a efeito de forma irregular, por não constar em nenhum deles a identificação do responsável pela confecção, assim como quem o contratou e a tiragem”. Essas informações são obrigatórias em materiais de propaganda de candidaturas, segundo resolução do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

A magistrada também apontou na liminar que a propaganda “não poderia ser divulgada porque, além da característica [de campanha] negativa, apresenta contornos de fake news, uma vez que induz o eleitor que professa a fé cristã a ter sentimentos de ódio e ojeriza pela candidata, porquanto imputa fatos notadamente inverídicos e ensejadores do repúdio da população”, segundo um trecho da decisão.

A coligação liderada por João Campos se manifestou ao ser citada na representação da candidatura adversária e negou qualquer relação com os materiais. O grupo disse tratar-se de “propaganda apócrifa, sem qualquer informação acerca da coligação ou do responsável pela confecção”, e que não há prova de autoria ou de conhecimento do fato por parte da campanha de Campos.

Em uma série de postagens no Instagram no dia 23 de novembro, Campos também negou relação com os materiais e disse que “jamais autorizaria qualquer tipo de ataque de baixo nível”. Ele afirmou ainda que foi “o primeiro a pedir ao Ministério Público a apuração de denúncias sobre materiais apócrifos vistos no Recife. De minha parte, nunca irão surgir ataques pessoais, baixarias, acusações ou notícias falsas.”

Procurada, a assessoria de Campos não retornou a mensagem até a publicação desta verificação.

Além da representação com pedido de liminar para proibir a circulação dos panfletos, a campanha de Marília Arraes também moveu uma Ação de Investigação da Justiça Eleitoral contra Campos e sua candidata a vice Isabella de Roldão (PDT) por suposta prática de abuso de poder econômico na distribuição dos materiais. Esta ação ainda não havia sido analisada pela Justiça eleitoral até as 13h de 26 de novembro de 2020.