SÃO PAULO – Esqueça a polarização nacionalismo versus globalismo . Para o historiador israelense Yuval Harari , autor de best-sellers como “Homo Deus: uma breve história do amanhã” e “21 lições para século 21”, não há contradição entre nacionalismo e globalismo. Pelo contrário: o globalismo, entendido como cooperação internacional para a resolução de problemas que afetam todo o planeta, só é possível graças a valores fomentados pelo nacionalismo, como a solidariedade e a sobreposição dos interesses coletivos aos individuais.

Ao lado do biólogo americano e vencedor do Pulitzer Jared Diamond , Harari, que nunca tinha vindo ao Brasil, participou, na manhã desta quarta-feira (6) do evento Cidadão Global 2019, realizado em São Paulo pelo jornal “Valor Econômico”, editado pelo Grupo Globo, e pelo banco Santander. Harari e Diamond falaram sobre o tema “O mundo em transformação – narrativas do século 21”. No sábado, o israelense estará no Rio para falar no lançamento da 3ª LER – Salão Carioca do Livro, no Teatro Municipal, às 19h30. Os ingressos já estão esgotados.

Em uma palestra de 45 minutos, Harari sugeriu novas definições para palavras que costumam inflamar o debate político – como nacionalismo, globalismo e fascismo – e afirmou que há três principais ameaças ao futuro da humanidade: a guerra nuclear, a disrupção tecnológica e o colapso ecológico.

Para Harari, o nacionalismo não deve ser identificado à xenofobia, ao ódio ao estrangeiro, mas à capacidade de amar o “estranho”, aquele com quem compartilhamos não laços de sangue, mas a nação.

– Nações são comunidades imaginárias – disse Harari. – O projeto nacionalista é criar laços com os estranhos e colocar o interesse da nação acima do interesse individual. Isso foi muito importante para o desenvolvimento da espécie humana. Sem o nacionalismo, viveríamos no caos, não em um paraíso liberal. Sem uma ideia de nação, não é possível criar sistemas de saúde, educação e seguridade social. A democracia não é possível sem um sentimento patriótico.

O israelense também argumentou que globalismo não é abandonar tradições e escancarar fronteiras, mas o compromisso com princípios capazes de regular as relações entre as nações. Essa definição de globalismo não é incompatível com os nacionalismos e um bom exemplo disso, disse ele, é a Copa do Mundo, quando as mais diversas nações concordam sobre algumas regras básicas sem abrir mão do patriotismo.

– Se você gosta da Copa do Mundo, você é um globalista – provocou.

O desafio, afirmou Harari, é incentivar os valores nacionalistas sem jogar lenha na fogueira da xenofobia e do fascismo. E exigir compromisso dos políticos com os problemas que ameaçam o futuro da humanidade.

– O fascismo é perigoso hoje porque nos levaria não só à guerra e ao genocídio, mas também nos impediria de lidar com ameaças existenciais que exigem cooperação global: guerra nuclear, colapso ambiental e disrupção tecnológica – afirmou. – Minha principal mensagem é a seguinte: nas próximas eleições pergunte aos políticos o que eles vão fazer, se eleitos, para diminuir os riscos da guerra nuclear e das mudanças climáticas e como vão regular a tecnologia. Pergunte como eles veem o mundo de 2050. Se eles não oferecerem uma visão de futuro ou falarem constantemente do passado, não vote neles.