28 filmes que marcaram Brasília

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     A investigação da identidade brasiliense, ainda sem desfecho, atiça uma geração que continua a procurar respostas para uma antiga questão: qual é a imagem do cinema brasiliense?

Crises e a irmanada dobradinha política e poder, além do próprio fazer cinematográfico, reinam como temas de uma cidade que define, via verbas estatais, a linhagem dos projetos de cinema. Muito antes, porém, das discussões sobre cinema brasiliense, a capital já posava para as câmeras. Cinegrafistas desciam de helicópteros para documentar as cenas da construção, amplificadas na película dos cinejornais. A partir de 1964, mestres como Nelson Pereira dos Santos e Paulo Emílio Salles Gomes formaram o corpo docente do primeiro curso superior de cinema do Brasil (na Universidade de Brasília), que desenvolveu obras sobre aquele período de formação.

Quando dotados do espírito documental, os cineastas fazem as descobertas de um passado com feições rejuvenescidas, dado o tom sempre avançado embutido na genética da cidade. Sem encerrar um conceito hierárquico, e não apenas orientado por títulos que contemplem Brasília como cenário, num levantamento — naturalmente impreciso, dado o volume de produções locais —, o Correio mapeou filmes influentes para a cidade. Este blog escolheu alguns que considera relevantes:

Os anos JK— uma trajetória política (Silvio Tendler, longa-metragem, 1980)
Mapeando episódios entre as décadas de 1940 e 1970, o diretor traça complexo painel político do país. Sucesso de público, venceu o troféu Margarida de Prata (da CNBB) e, junto à sociedade oprimida, exaltou o ideal democrático representado na figura de Juscelino Kubitschek.

Athos (Sérgio Moriconi, média-metragem, 1998)
O depoimento do artista plástico Athos Bulcão já garantiria relevância ao curta de Moriconi. Mas o cineasta e crítico ousa ao intercalar a entrevista com citações cinematográficas e elementos de ficção.

Barra 68 — sem perder a ternura (Vladimir Carvalho, longa-metragem, 2000)
Atento ao poder de comoção das imagens que registram a invasão de tropas militares na UnB, Vladimir faz um elogio à memória da universidade e à luta contra a repressão.

Brasília (Cacá Diegues, curta-metragem, 1960)
“Isso daqui será uma cidade?”Era a indagação recorrente de Cacá Diegues que, aos 18 anos, tinha à frente “um deserto de poeira vermelha e placas que indicavam as futuras edificações”. De posse de uma câmera 16mm, emprestada pelo amigo David Neves, Diegues acompanhou o pai, um funcionário público, na capital em obras. A lembrança da cidade em construção ficou apenas na memória do realizador: nenhuma cópia do filme foi preservada.

Brasília, a última utopia (Pedro Anísio, Geraldo Moraes, Vladimir Carvalho, Pedro J. Castro, Moacir Oliveira e Roberto Pires, longa-metragem, 1989)
Seis curtas-metragens encomendados a partir da nomeação da capital como Patrimônio Cultural da Humanidade, em 1987. Com 20 anos de distanciamento, permaneceram os espíritos de universalidade e de matriz de identidade encorpados na proposta.

Brasília: contradições de uma cidade nova (Joaquim Pedro de Andrade, média-metragem, 1967)
“A primeira metade do filme tem um tom quase institucional. É a imagem que se tem da cidade vista de fora. Na metade, a narrativa dá uma guinada e se transforma em um documentário direto, o retrato de uma capital pulsante, que não foi planejada”, comenta Pablo Gonçalo, cineasta, crítico e coordenador do curso de cinema e mídias digitais do Iesb. Pouco antes da produção do clássico Macunaíma, o diretor Joaquim Pedro de Andrade, ao lado do fotógrafo Affonso Beato, revelou mazelas nesse filme que se debruça sobre problemas visíveis como moradias insuficientes, a formação da periferia e dados de mortalidade infantil. (Um dos meus preferidos!)

Brasília — um dia em fevereiro (Maria Augusta Ramos, média-metragem, 1996)
Vencedor do troféu Câmara Legislativa do DF, enfatizou o poder de observação da diretora dos documentários Juízo e Justiça, que não se rendeu ao formato de entrevistas. Numa estratificação social, despontam um vendedor ambulante, uma representante da alta sociedade e uma estudante universitária.

Brasiliários (Sérgio Bazi e Zuleika Porto, curta-metragem, 1986)
Em consonância com níveis documental e fictício empregados por Clarice Lispector nas crônicas Brasília: esplendor e Nos primeiros tempos de Brasília, o filme valeu-se dos contrastes arquitetônicos da capital.

Celeste & Estrela (Betse de Paula, longa-metragem, 2002)
“Lugar de dinheiro é Brasília”, diz uma das personagens do triângulo amoroso (formado por um casal que ama o cinema) destacado pela fita. Em cena, uma aspirante a cineasta (Dira Paes) se enamora de um burocrata do Ministério da Cultura (Fábio Nassar), na leve comédia que brinca com clichês e citações cinematográficas.

A céu aberto (João Batista de Andrade, longa-metragem, 1985)
Brasília não é o único cenário para a trajetória da “voz originária da democracia” personalizada na figura do presidente Tancredo Neves. Mas, é na capital que a morte do líder conciliador causa grande parte da comoção registrada entre jornalistas, líderes e, particularmente, anônimos.

Conterrâneos velhos de guerra (Vladimir Carvalho, longa-metragem, 1992)
Em um artigo escrito em 1992, Vladimir Carvalho definiu Conterrâneos velhos de guerra como “a crônica dos lances enfrentados pelos nordestinos que vieram, no fim dos anos 1950, para a construção de Brasília.” O filme é isso, mas a descrição subestima o desenho monumental de uma epopeia do Centro-Oeste. “É um resgate muito rico da história da cidade. No início da carreira, Vladimir filmava o homem nordestino. Em Conterrâneos, ele buscou aqueles nordestinos aqui, na capital”, comenta Marcos de Souza Mendes, cineasta e professor da UnB. (A Professora e pesquisadora Shirley Carvalhedo é especialista neste filme).

Fala, brasília (Nelson Pereira dos Santos, curta-metragem, 1966)
Como inaugurar uma cinematografia? Neste documentário, projetado por professores e alunos do curso de cinema da UnB e dirigida por Nelson Pereira dos Santos, a narrativa ganha uma dimensão de um manifesto: mais do que registrar a construção física de Brasília, a câmera se encontra com os brasileiros que chegam à capital. A diversidade de sotaques é o tema central de um curta que instiga possibilidades para uma arte comprometida com a documentação e a análise de uma nova realidade. Eis o nascimento de uma cidade — e de um cinema.

O homem do Rio (Philippe de Broca, longa-metragem, 1964)
Vestido em um impecável smoking branco, Jean-Paul Belmondo cruza a plataforma inferior da Rodoviária do Plano Piloto e, em um corte abrupto, aparece sob o Palácio do Planalto. Não foram poucas as liberdades tomadas pelo diretor francês Philippe de Broca. Uma cidade em obras, esvaziada, é recriada sob a névoa de barro vermelho. Rio de Janeiro e a Amazônia também entraram no itinerário desta fita de aventura, coprodução entre França e Itália. (Muito diferente esta filmagem)

A idade da Terra (Glauber Rocha, longa-metragem, 1980)
Obra aberta por natureza, com a invasiva presença do próprio cineasta, tem discurso engajado, a postos para subverter a ordem e difundir uma espécie de transe visual. Nele, o fundamental traço nacionalista de Glauber é expurgado. Nas sequências mais endiabradas, Maurício do Valle perambula pela capital, com intermináveis provocações, tendo como fundo a incipiente fachada do Conjunto Nacional e um Teatro Nacional em obras.

Inferno no Gama (Afonso Brazza, longa-metragem, 1993(
“Como numa perfeita síntese para a pontuação trash do Brazza, o filme foi construído enquanto o governo Collor desmantelou o cinema brasileiro. No longa, dá para notar uma mudança de posicionamento do diretor: ele entrou em contato com o público”, disse Pedro Lacerda, amigo e realizador que finalizou Fuga sem destino no lugar de Afonso Brazza, morto em 2003.

O jardineiro do tempo (Mauro Giuntini, curta-metragem, 2001)
Diretor do longa Simples mortais, Giuntini lança luz sobre um dos estetas que interveio na elaboração da cidade: o paisagista Roberto Burle Marx. No itinerário visual, despontam os jardins da 308 Sul, as praças do Parque da Cidade e do Setor Militar Urbano, além do Palácio do Itamaraty.

Momento trágico (Cibele Amaral, curta-metragem, 2003)
Comédia, premiada pelo júri popular no Festival de Brasília, que promoveu arrastão de Kikitos no Festival de Gramado de 2004, ao faturar prêmios de melhor filme (ratificado pelo júri popular), de direção e de melhor ator (André Deca), trata de uma ciranda de amores e neuroses, com direito a um espião infiltrado em terapia de grupo.

Oficina Perdiz (Marcelo Diaz, média-metragem, 2006)
À margem dos padrões de uma cidade planejada, a “irregular” Oficina Perdiz (na Asa Norte) é um híbrido de teatro e oficina mecânica que enfrentou uma série de ameaças de interdição. Marcelo Díaz narra essa história com afetuosidade, mas sem evitar a provocação política.

Oscar Niemeyer — a vida é um sopro (Fabiano Maciel, longa-metragem, 2008)
A simplicidade do registro é o mérito desta longa (mas nunca enfadonha) entrevista com Niemeyer, que conversa sobre velhice, política, arquitetura, Brasília e beleza. Abriu o Festival de Brasília de 2008.

Patriamada (Tizuka Yamasaki, longa-metragem, 1985)
Registrar a transição do regime militar para o meio civil foi a proposta do longa que teve três dias de filmagens em Brasília, com a equipe disfarçada de profissionais da tevê. Débora Bloch e Walmor Chagas, respectivamente, dão vida à jornalista de esquerda e ao empresário, na história inspirada no clima das Diretas Já!.

Rap, o canto da Ceilândia (Adirley Queiroz, curta-metragem, 2005)
“O rap estava ali, na minha casa, na rua, no campo de futebol. Foi importante para a minha autoafirmação”, contou o diretor estreante Adirley Queiroz ao Correio, poucos dias depois de ter vencido os prêmios de júri e público no 38º Festival de Brasília. Amplificar a identidade da periferia — nem que na marra —, é o tema deste documentário duro sobre o hip-hop de Ceilândia.

O risco — Lucio Costa e a utopia moderna (Geraldo Motta Filho, longa-metragem, 2002)
Com material de arquivo enriquecido pela ótica do próprio urbanista (em imagens 8mm feitas entre os anos de 1930 e 1960), o filme modela o nascimento e o desabrochar da arquitetura moderna. Entre os depoimentos, na íntegra registrados em livro, o arquiteto, professor e pintor Sérgio Ferro avalia: “A forma do Lucio Costa, sempre aparentemente tímida, simples, sem arroubos transcendentais, me parece muito mais próxima do projeto dele, do que a utopia do Niemeyer. Eu não oporia nunca o uso à forma”.

Samba em Brasília (Watson Macedo, longa-metragem, 1960)
Nesta chanchada carioca, Brasília representa o sonho de ascensão social de uma porta-bandeira salgueirense, insatisfeita com um cotidiano sem luxo. Mesmo fora de cena, a nova capital atrai personagens em busca de uma vida melhor.

A terceira margem do rio (Nelson Pereira dos Santos, longa-metragem, 1992)
Quase 30 anos depois de ter marcado uma posição de pioneirismo no cinema brasiliense (com o curta Fala, Brasília, de 1966), Nelson Pereira dos Santos se lançou em outra aventura: conduziu o primeiro longa filmado no Pólo de Cinema, campo de produção erguido em Sobradinho. Dupla ousadia, já que esta tradução de Guimarães Rosa desafiou um dos períodos mais penosos do cinema brasileiro, cravado na aridez da era Collor. Nelson respondeu às provações com uma adaptação quase sem floreios. Corajosamente, converte precariedade em mágica.

Vestibular 70 (Vladimir Carvalho e Fernando Duarte, curta-metragem, 1970)
Neste retrato em preto e branco, concebido pelo curso de cinema da UnB, os corredores da universidade são retratados como campo para uma batalha. Os gladiadores: mais de cinco mil estudantes que, anônimos, disputam vagas no vestibular de 1970.

O sonho não acabou (Sérgio Rezende, longa-metragem, 1982)
Uma desencanada primeira geração de brasilienses habita a estreia do diretor pela ficção. Na pele de uma hippie, Lucélia Santos vê até um disco voador no Lago Norte, enquanto se multiplicam na tela locações como uma mansão do Lago Sul, a agitada 109 Sul, no colégio Leonardo da Vinci (onde eu estudava no dia da gravação), a Torre de TV e até o Vale do Amanhecer. A rotina de um grupo de jovens, com seus sonhos, aspirações e desilusões. Após a opressão nos anos 60, uma nova geração de jovens em Brasília procura escapar do conformismo. Alguns deles experimentam drogas e, eventualmente, fazem parte do tráfico. Numa noite, todos se encontram no mesmo lugar, mas cada um terá um destino diferente. Marcou a estreia de vários atores no cinema brasileiro, dentre os quais Lauro Corona, Miguel Falabella e Lucélia Santos. Reconhecido pela crítica especializada como um dos 10 melhores filmes lançados em 1982. Um filme marcante que vale a pena ser visto por quem viveu a juventude em Brasília. O meu preferido.

Faroeste Caboclo (René Sampaio, 2013)
Inspirado na canção homônima, da banda Legião Urbana. A saga de João de Santo Cristo e Maria Lúcia foi lançada em 1987 e conta a história de um nordestino que chega a Brasília, torna-se traficante, apaixona-se por uma jovem chamada Maria Lucia e tenta deixar o crime, mas é morto por um traficante rival. O filme foi lançado em 30 de maio de 2013.1 O filme faturou 15,5 milhões em bilheteria e levou 1,4 milhão de pessoas aos cinemas em 2013.

Somos tão jovens (Antônio Carlos da Fontoura, 2013)
Brasília, 1973. Renato (Thiago Mendonça) acabou de se mudar com a família para a cidade, vindo do Rio de Janeiro. Na época ele sofria de uma doença óssea rara, a epifisiólise, que o deixou numa cadeira de rodas após passar por uma cirurgia. Obrigado a permanecer em casa, aos poucos ele passou a se interessar por música. Fã do punk rock, Renato começa a se envolver com o cenário musical de Brasília após melhorar dos problemas de saúde. É quando ajuda a fundar a banda Aborto Elétrico e, posteriormente, a Legião Urbana. Uma obra musical e biográfica sobre a juventude de Renato Russo.

Fonte: Correio Braziliense / Blog da Marina Mara

* Marina Mara é brasiliense, nasceu em trinta de março de 1979. É graduada em Comunicação Social e trabalha como produtora cultural independente. A poeta venceu alguns concursos de poesia, conto e redação, dos quais destacam-se o Prêmio Criatividade 2005, realizado pelo Governo do Distrito Federal e, em 2006, teve sua redação escolhida entre mais de 37 mil textos de todo o país para compor um livro em homenagem ao centenário do voo do 14 Bis.

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