Morre, aos 89 anos, a gravurista e professora Anna Letycia

Artista inaugurou a Oficina do Ingá, em 1977, que se tornou polo de criação e troca de experiências nos anos 1980

Anna Letycia: professora de nomes como Alair Gomes, Aluísio Carvão, Rubem Grilo e Analu Cunha Foto: Leo Aversa
Anna Letycia: professora de nomes como Alair Gomes, Aluísio Carvão, Rubem Grilo e Analu Cunha Foto: Leo Aversa
O Globo

RIO — Aluna de grande nomes das artes brasileiras, como Oswaldo Goeldi, Iberê Camargo e Darel Valença Lins, a gravurista Anna Letycia criou, em 1977, a Oficina do Ingá, em Niterói, que formou gerações de artistas nas décadas seguintes. Nos anos 1980, o projeto montado no Museu do Ingá tornou-se um polo de criação e de troca de experiências, junto ao Parque Lage e às oficinas do Museu de Arte Moderna (MAM).

Mas não apenas estudantes interessados em gravura foram alunos de Anna Letycia: nomes como Alair Gomes, Aluísio Carvão, Rubem Grilo, Ronaldo do Rego Macedo e Analu Cunha passaram pela Oficina do Ingá, um ponto de efervescência cultural que fazia com que muitos artistas atravessassem a Baía da Guanabara.

— Não cheguei a ser aluno da Anna, mas na época era comum irmos a Niterói e ver o que estava acontecendo na Oficina — lembra Marcus Lontra, curador da icônica coletiva “Como vai você, Geração 80?”, realizada em 1984 na Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage.

Gravura assinada por Anna Letycia: das referências naturais à abstração Foto: Guito Moreto
Gravura assinada por Anna Letycia: das referências naturais à abstração Foto: Guito Moreto

Lontra assinou a curadoria, ao lado de Viviane Matesco, da exposição “Experimentação e método”, realizada no ano passado no museu niteroiense, para celebrar os 40 anos da Oficina do Ingá. A mostra contava com obras de alunos famosos de Anna Letycia e da própria gravadora.

— Mesmo sendo uma referência da gravura, a Anna sempre foi muito sensível e completamente aberta a outras linguagens. Talvez por isso a Oficina atraísse artistas tão diferentes, interessados naquele espaço de livre criação — destaca Lontra. — Por maior que fosse a ousadia de seus jovens alunos, todos traziam uma disciplina com o trabalho que era própria da Anna.

Aluna de Iberê Camargo e Oswaldo Goeldi

Nascida em Teresópolis, em 1929, Anna Letycia iniciou seus estudos artísticos com o desenho e a pintura com Bustamante Sá (1907 —1988), na Associação Brasileira de Desenho, no Rio. Na década de 1950, estudou gravura com Darel Valença Lins (1924 — 2017), na então Escola Nacional de Belas Artes (Enba). Após estudar com Iberê Camargo (1914-1994), fez curso de xilogravura com Oswaldo Goeldi (1895-1961).

Também foi aluna de Ivan Serpa (1923-1973), participando da criação do Grupo Frente, marco no movimento construtivo brasileiro, ao lado de nomes como Abraham Palatnik, Lygia Pape, Lygia Clark, Hélio Oiticicae Franz Weissmann. Entre 1960 e 1966, lecionou gravura no ateliê do MAM.

A partir de formas da natureza, Anna Letycia passou à abstração, dentro de um processo calcado em intensa pesquisa técnica e formal. Ficou à frente da Oficina do Ingá de 1977 até 1998, mas mesmo longe das prensas não deixou de criar. Em 1996 ganhou uma retrospectiva no Paço Imperial e, dois anos depois, foi publicado o livro “Anna Letycia”, da professora e curadora Angela Ancora da Luz.

“A gravura dá mais trabalho, mas continuo me dedicando à pintura, às colagens. O hábito que você adquire no ateliê é difícil de perder”, disse a artista em entrevista no ano passado, por conta da exposição “Experimentação e método”.

Anna Letycia morreu nesta terça-feira, vitima de enfisema pulmonar, aos 89 anos.

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