Modelo de Previdência defendido por Paulo Guedes está em crise no Chile

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Paulo Guedes precisa pensar na reforma da reforma

Raquel Landim
Folha

Jair Bolsonaro (PSL), líder nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência, ainda não deu detalhes, mas informou em seu programa de governo que deseja introduzir no Brasil a capitalização como novo modelo de Previdência. A inspiração viria do Chile, país que viveu uma revolução liberal nos anos 1980, incluindo uma profunda reforma da Previdência, observada in loco pelo guru do candidato, Paulo Guedes, que lecionou naquela época no país. Uma das primeiras nações do mundo a privatizar seu sistema de seguridade social, o Chile está às voltas hoje com a “reforma da reforma”.

O país tem a renda per capita mais alta da América Latina, mas, segundo o órgão regulador do sistema de aposentadorias do país, os aposentados chilenos recebem de benefício, em média, de 30% a 40% do salário mínimo local.

NOVA REFORMA – Recém-eleito para um novo mandato, o presidente Sebastián Piñera está em vias de enviar uma reforma ao Congresso, que vai obrigar empregadores a também contribuir com 4% da folha de pagamento. Hoje nem os empregadores nem o Estado colaboram com o sistema chileno.

Apenas os funcionários depositam o equivalem a 10% do seu salário em contas individuais, chamadas de AFPs (administradoras privadas de fundos de pensão).

“O Chile experimenta as delícias e as dores do sistema de capitalização, modelo que tem a simpatia do candidato Bolsonaro”, disse o economista Pedro Fernando Nery, especialista em Previdência.

DOIS MODELOS – Existem hoje no mundo dois modelos principais de Previdência: por repartição, adotado no Brasil, e por capitalização, como o implementado no Chile. Muitos países acabam optando, contudo, por um misto dos dois.

O Chile introduziu a capitalização em 1981 durante a ditadura do general Augusto Pinochet em meio a uma série de reformas promovidas pelos “Chicago boys”, economistas de viés liberal com passagem pela Universidade de Chicago.

Naquela época, os chilenos ainda viviam o bônus demográfico, quando a taxa de crescimento da população em idade ativa é maior do que a total. Isso facilitou a reforma porque o governo local teve de retirar menos recursos do Orçamento para pagar benefícios dos aposentados.

REALIDADE HOJE – No Chile, os recursos depositados nos fundos de aposentadoria agora chegam a 70% do PIB do país. Esse dinheiro é aplicado no mercado financeiro e impulsiona o crédito, gerando investimentos, empregos e crescimento.

Surgiu, contudo, uma massa de idosos que, por diversos motivos, seja por falta de renda, seja por anos no trabalho informal, não pouparam. Em 2008, o Chile foi obrigado a fazer a primeira reforma. A então presidente, Michele Bachelet, criou um fundo estatal para garantir uma pensão básica para quem não contribuiu com o sistema.

“O Chile foi um laboratório do experimento ultraliberal do período Pinochet. A maioria dos países hoje caminha para um sistema de Previdência que mistura a repartição, para garantir uma renda mínima, e a capitalização”, disse o economista Paulo Tafner, especialista em Previdência Social.

NÃO DÁ CERTO – À Folha o secretário de Previdência do Ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, disse que um modelo de capitalização exclusivo não resolve os dois principais problemas da Previdência: o rombo financeiro e a desigualdade. A previsão é que o déficit da Previdência — somados INSS e setor público — chegue a R$ 290 bilhões em 2018.

O sistema é injusto: enquanto a maioria da população recebe salário mínimo, uma casta de servidores tem aposentadorias que superam R$ 30 mil.

“Fizemos um diagnóstico, identificamos os problemas e propusemos uma solução que passa por estabelecer uma idade mínima e tornar o sistema mais igualitário. A capitalização não resolve nenhum desses pontos. Foi por isso que não a incluímos na reforma”, disse Caetano.

SEM DETALHES – Paulo Guedes, assessor de Bolsonaro, parece ciente dessa questão. Em seu programa de governo, o candidato diz que “serão necessárias reformas para aperfeiçoar o modelo atual e para introduzir o novo modelo” e que as mudanças serão “paulatinas”. Não oferece, porém, resposta para o principal problema da transição: a falta de recursos.

Se a transição for imediata, levando para o novo modelo todos os contribuintes que ainda não se aposentaram, o buraco seria de R$ 400 bilhões por ano, ou o equivalente a cerca de 5% do PIB.

Para o professor David Blake, diretor do Instituto de Pensões da Cass Business School, de Londres, a migração é viável, desde que em ritmo aceitável. “Com uma população envelhecida, o modelo exclusivo de repartição é insustentável. Algum tipo de capitalização é necessário”, afirmou.

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