MPF investiga se Jefferson, mesmo preso, e Cristiane Brasil orientaram ONG a fraudar registro sindical

Registro Espúrio apura pagamento de propina de entidades a parlamentares ligados ao Ministério do Trabalho

Por Daniel Biasetto

O presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, e sua filha, a deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ), orientaram uma ONG que prestava serviços à Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) a fraudar os requisitos necessários para conseguir o registro sindical no Ministério do Trabalho. A afirmação é do presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado do Rio (Sindaperj), Wilson Antônio Camilo Ribeiro, que denunciou o caso em 2016/2017 ao Ministério Público Federal (MPF) e ao próprio Ministério do Trabalho. A denúncia serviu de base para a Polícia Federal deflagrar a operação Registro Espúrio, na qual Jefferson e Cristina são investigados por pagamento de propina na concessão de registros sindicais. O caso corre em sigilo na Procuradoria Geral da República, em Brasília.

O registro sindical é o primeiro passo para uma entidade obter a Carta Sindical, que lhe permite cobrar mensalidade de seus associados. No último dia 30 de maio, agentes da PF estiveram nos gabinetes dos deputados federais Paulinho da Força (SD-SP), Jovair Arantes (PTB-GO) e Wilson Filho (PTB-PB). A prisão dos deputados foi pedida, mas negada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin. Roberto Jefferson, também foi alvo da investigação, porém nada foi provado contra ele. De acordo com os investigadores, ele apenas teria conhecimento do esquema, sem participar.

A pedido do MPF, o STF autorizou aplicação da chamada “medida cautelar diversa de prisão”. No processo, além de proibir a entrada no ministério, os parlamentares não poderão entrar em contato com outros investigados.

Registro adulterado

Os dirigentes do sindicato Marcos Ferreira (de vermelho) e Gutemberg de Oliveira posam para foto no gabinete da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) – Divulgação

De acordo com Camilo, o esquema foi articulado ainda quando Jefferson cumpria pena pelo mensalão no Instituto Penal Francisco Spargoli Rocha, em Niterói, e contava com anuência do ex-secretário da Seap, coronel Erir Ribeiro. Camilo sustenta que, durante o período em que ficou preso na unidade, entre fevereiro de 2014 e maio de 2015, Jefferson passou a receber com frequência a visita dos dirigentes da ONG que virou sindicato: Gutemberg de Oliveira, Marcos Ferreira de Lima e Francisco Rodrigo Rosa.

Até o momento, Roberto Jefferson não respondeu ao GLOBO. Pelo Twitter, o presidente do PTB negou ter recebido outras pessoas, quando esteve preso, além de advogados, familiares e amigos. E diz que “na data citada pelo pasquim, Cristiane tinha acabado de assumir o mandato de deputada federal, e o ministro do Trabalho era o Carlos Lupi, do PDT”.

Marcos Ferreira foi candidato a vereador e deputado estadual pelo PTB. Ele, assim como os demais dirigentes da ONG, também são funcionários de carreira da Seap e ocupam cargos de chefia na secretaria.

A ONG, cuja razão social é Sindicato dos Servidores da Secretaria da Justiça, mas que se denomina Sindicato dos Servidores do Sistema Penal do Rio (SindSistema-RJ), tem sua competência, bem como a prestação de serviços, questionadas no Tribunal de Justiça do Rio pela entidade que representa os servidores penintenciários. De acordo com o processo, que corre na 14ª Vara Cível, a natureza jurídica do Sindsistema é de ONG voltada para ações de defesa de direitos sociais ligadas à cultura e à arte, não tendo, portanto, a natureza jurídica de “entidade sindical”, como deve ficar comprovado para a liberação do registro.

Mesmo após a denúncia de fraude ao MPF e ao próprio Ministério do Trabalho, a Secretaria de Relações do Trabalho concedeu o registro ao Sindicato dos Servidores da Secretaria de Justiça, conforme mostra a publicação no Diário Oficial da União do dia 10 de fevereiro de 2017, assinada pelo então secretário Carlos Cavalcante Lacerda, exonerado em abril. Lacerda é filiado ao Solidariedade, partido do deputado Paulinho da Força (SD-SP), também investigado na Regitro Espúrio.

Quatro meses depois de garantir o registro sindical, o SindiSistema foi convidado pelo secretário de Relações do Trabalho para receber a Carta Sindical das mãos do então Superintendente Regional do Trabalho e Emprego, Helton Moura. Moura é afilhado político de Roberto Jefferson e Jovair Arantes (PTB-GO), também investigado na Registro Espúrio, e responsáveis pela manutenção dele como atual ministro do Trabalho.

– Houve uma fraude na documentação levada ao Ministério do Trabalho, que ignorou a nossa denúncia e mesmo assim emitiu a Carta Sindical a uma ONG. Curioso, que isso tudo aconteceu depois de diversas visitas feitas pelos diretores da ONG Gutemberg de Oliviera, Marcos Ferreira e Francisco Rosa ao ex-deputado Roberto Jefferson, que domina há anos as indicações políticas no Ministério do Trabalho. A deputada Cristiane Brasil também participava dessas visitas quando

O presidente do Sindsistema, Gutemberg de Oliveira, negou que tenha visitado Roberto Jefferson, mas disse ter encontrado com Cristiane Brasil em outras oportunidades para discutir temas de interesse da categoria. Ele também confirma que esteve com Carlos Lacerda apenas na cerimônia de entrega da Carta Sindical.

Assembleia fantasma

O presidente do Sindsistema, Gutembergue de Oliveira, recebe a Carta Sindical das mãos do então Superintendente Regional do Trabalho e Emprego, Helton Yomura, hoje ministro do Trabalho. – Divulgação

O Ministério do Trabalho fez vistas grossas ao conceder o registro sindical à entidade que representa os servidores da Secretaria de Justiça do Estado do Rio. Uma ONG, voltada para ações culturais e artísticas que nada têm a ver com atividades sindicais, fraudou entre outras exigências, a ata de uma Assembleia Geral Extraordinária que não aconteceu e a apresentação de uma lista de participantes falsificada e com duplicidade em assinaturas ao qual o O GLOBO teve acesso.

O pagamento de propina a servidores indicados por caciques do PTB e Solidariedade, em troca de registros sindicais dentro da Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério do Trabalho, está sendo investigado pela Polícia Federal no âmbito da operação Registro Espúrio, que em maio mirou Roberto Jefferson e os deputados Jovair Arantes (PTB-GO) e Paulinho da Força (SD-SP).

Registro sindical – assinaturas – Reprodução

A Secretaria de Relações de Trabalho é a pasta responsável pelo registro sindical das entidades. Exonerado em abril por ter dado aval à volta do imposto sindical após realização de assembleia, o ex-secretário Carlos Lacerda foi quem concedeu a Carta Sindical ao Sindsistema-RJ. O presidente da entidade, Gutemberg de Oliveira, porém diz que contribuição de R$ 35 seus 3.200 associados é facultativa. Ele se diz contra a cobrança compulsória, mas confirmou que todos os associados colaboram mensalmente com a taxa.

Na lista de presença da Assembleia Geral Extraordinária, com pouco mais de 60 nomes, O GLOBO identificou ao menos duas irregularidades: a duplicidade do nome do servidor Walter da Silva e a inclusão de Dilson Ramos, sem o seu consentimento.

Ao GLOBO, Ramos diz ter ficado surpreso quando viu seu nome na lista e afirmou que sequer houve assembleia.

Registro sindical – assinaturas – Reprodução

– Fui orientado a assinar um documento que serviria como abaixo-assinado para pleitear um benefício para nossa categoria, não estava claro que era para obter registro no Ministério do Trabalho. Além disso, não me recordo de nenhuma outra pessoa assinando após a minha vez, só sei que naquela data ninguém assinou e não aconteceu assembleia nenhuma.

Já Gutemberg diz que houve sim assembleia e credita à intriga da oposição as denúncias que lhe são imputadas.

Roberto Jefferson e Cristiane Brasil não retornaram às ligações da reportagem.

Procurada, a Seap se llimitou a dizer que sua relação “não é com nenhuma entidade representativa”, e sim com a categoria.

– A preocupação da Seap é com os servidores, independente do sindicato – afirmou o secretário David Anthony.

O Ministério do Trabalho afirmou que não irá se pronunciar enquanto perdurar a sindicância instaurada junto à Secretaria de Relações do Trabalho (SRT).

O coronel Erir Ribeiro não foi localizado.

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