E eles foram infelizes para sempre: amor não teve espaço nos casamentos reais da História

Alianças políticas motivaram uniões e adultérios eram comuns e conhecidos pela Corte

Domitila e Pedro I: romance revoltou a população e humilhou Leopoldina – Reprodução

RIO — Príncipes e princesas apaixonados superam dificuldades aparentemente intransponíveis e vivem um conto de fadas, sob a admiração de seus súditos. Na véspera do Dia dos Namorados, quem vibrou com o recente casamento do príncipe britânico Harry com a americana Meghan Markle tem dificuldade de imaginar que, durante séculos, não havia amor nos casamentos reais, como nos livros infantis. Mas a História mostra que a união de coroados sempre foi movida por frias alianças políticas. Não raros, os momentos tórridos eram reservados a amantes. Mas os affairs não ocorriam nas sombras — pelo contrário, eram acompanhados por toda a população, que geralmente toma partido das rainhas traídas ou das madames que lhes despejavam da cama dos monarcas.

No reinado de D. Pedro I, por exemplo, o povo tomou as dores da imperatriz Leopoldina, quando seu marido a traiu por anos com Domitila de Castro Canto e Melo. O soberano a conheceu em São Paulo em 1822, poucos dias antes da Independência. Quando ele voltou ao Rio, mantiveram uma constante troca de correspondências, em que assinavam como “Titília” e “Demonão”.

Cansado da distância, o imperador trouxe a amada à Corte em 1824, transformando-a em dama de companhia de Leopoldina, que chamava a rival pelas costas de “aquela bruxa”. Apenas um ano depois, Pedro I deu a Domitila o título de viscondessa e, por último, marquesa de Santos.

— A influência política de Domitila sobre o imperador foi descrita nas cartas de diplomatas desde seu tempo de dama de companhia — explica Paulo Rezzutti, pesquisador e autor de “Domitila: a verdadeira história da Marquesa de Santos”. — A população tomou as dores de Leopoldina, que foi humilhada em público. Quando ela morreu, em 1826, o povo culpou a amante do imperador e apedrejou sua casa.

Pedro I só se desfez de Domitila em 1829, quando soube que o adultério estava fechando portas para ele na Europa. Seus pedidos de casamento no continente foram rejeitados sete vezes até ele subir ao altar com a nova imperatriz, Amélia. Domitila, rejeitada, voltou para São Paulo.

Ana Bolena e Henrique VIII: mulher foi decapitada após acusações de incesto e adultério – Reprodução

Ana fez questão de dificultar a vida de Henrique. Permitia algumas carícias, mas recuava, alegando ser uma moça recatada. Na verdade, não queria ser só mais uma a passar pelos aposentos reais. O soberano entendeu o recado: afastou-se de Maria Bolena e comprou briga com o Papa Clemente VII para conseguir o divórcio de Catarina, o que era proibido pela Igreja.

María Pilar Queralt del Hierro, autora do livro “Rainhas na sombra” (Versal Editores), destaca que o processo de nulidade se arrastou por seis anos e culminou no rompimento da Inglaterra com o Vaticano, criando a Igreja Anglicana.

— Evidentemente já existiam tensões entre a Igreja e o Estado antes deste episódio. Além disso, a estratégia de Ana Bolena para persuadir o rei a se casar com ela foi resistir a seus avanços até ele, perdidamente apaixonado, decidir enfrentar a todos. Mas ficou claro que ela não conhecia o risco que correria — explica.

O risco: não dar à luz um menino que sucedesse o marido no trono. E, de fato, fracassou. Teve apenas a princesa Elizabeth e um menino que nasceu morto. Henrique, já apaixonado por outra jovem, Jane Seymour, desistiu. Acusou Ana de adultério com vários homens, entre eles o próprio irmão — que negou o caso — e um mestre de dança — que confessou, sob tortura. Todos foram condenados a morrer decapitados. No dia seguinte à execução de Ana, o rei casou-se com Jane.

Tela “A morte de Cleópatra”, de Reginald Arthur (1892) – Reprodução

SUICÍDIO DE CLEÓPATRA

Havia, no entanto, uniões que foram até o final movidas por amor. Pelo menos no imaginário popular. Uma delas foi a do general e cônsul romano Marco Antônio com a rainha Cléopatra, uma das mais emblemáticas figuras do Egito Antigo. O relacionamento serviu como pretexto para que Otaviano, rival de Marco Antônio, declarasse guerra a Cleópatra. O confronto desencadeou o suicídio do casal, em 30 a.C.

— Foi um período de grande instabilidade em Roma — conta Natália Frazão José, doutora em História Antiga da Unesp. — Marco Antônio casou-se com Otavia, irmã de Otaviano, em uma tentativa de se estabelecer uma paz política. Mas ele pediu divórcio, casou-se com Cleópatra e reconheceu os três filhos que teve com ela.

Ofendido, Otaviano denunciou ao Senado que Marco Antônio aliou-se a uma estrangeira e corrompeu os “valores romanos”. No entanto, como seu rival era muito popular entre a plebe, Otaviano decidiu atacar o Egito.

— É um período difícil de descrever, porque toda a historiografia foi feita após a vitória de Otaviano, e por isso favorece o seu lado e denigre o de Marco Antônio. Segundo a lenda, alguém conta a Marco Antônio que Cleópatra havia sido morta, e ele se apunhala como punição por perder seu amor. Na verdade, ela ainda estava viva. Quando é informada da morte do marido, Cleópatra se deixa envenenar por uma serpente — conta Natália.

oglobo

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