Um cenário exaltado e indefinido

Bate-boca entre senadores durante discussão da reforma trabalhista

Por Helio Gurovitz

O bate-boca entre os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Ataídes Oliveira (PSDB-TO) na sessão de análise da reforma trabalhista da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (foto) mostra bem o clima político em Brasília depois da delação mega-premiada da JBS.

É previsível que a indefinição política contamine qualquer tentativa de fazer avançar as reformas. O clima no Congresso só tende a ficar ainda mais acirrado com a recusa do presidente Michel Temer em renunciar, apesar das denúncias que pesam contra ele – que não se restringem à gravação de sua convesa com o empresário Joesley Batista.

Não é por outro motivo que partidos da base de apoio ao presidente, como PSDB, DEM ou PSD, já negociem nos bastidores a sucessão, apostando que a candidatura Dilma/Temer será cassada no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), previsto para o próximo dia 6 de junho.

A delação da JBS forneceu um argumento adicional em prol da cassação, ao confirmar que as contas das campanhas de Dilma e Temer estavam interligadas na eleição de 2014. Os R$ 15 milhões que os delatores afirmam ter entregado a Temer vieram, segundo eles, da conta corrente mantida por Joesley para o PT, mantida com dinheiro desviado do BNDES. Embora tal prova não faça parte do processo no TSE, os fatos podem influenciar o voto dos ministros.

O julgamento no TSE colocará o país diante de uma série de indefinições. Eis as principais possibilidades:

1) Absolvição – Temer deverá insistir em permanecer no cargo, com agravamento da crise política. Mesmo que tente fazer andar a agenda de reformas no Congresso, é improvável que consiga, fustigado pelas denúncias da delação da JBS.

2) Condenação, com recurso – Mesmo que seja obrigado a sair do cargo, Temer poderá recorrer da sentença. Não haverá então outro remédio: será preciso aguardar o julgamento de seus recursos. Como na situação anterior, o enfraquecimento do governo continuará a contaminar o Congresso.

3) Condenação, sem recurso – Se Temer aceitar sair, outra indefinição se imporá: quais serão as regras das novas eleições? O artigo 81 da Constituição afirma que, depois de assumir o cargo no lugar de um vice deposto, o presindente da Câmara, Rodrigo Maia, deverá convocar eleições indiretas em 30 dias. O Código Eleitoral fala em eleições diretas. Será necessário que o Supremo Tribunal Federal (STF) se pronuncie sobre a questão. O mais provável é que a Constituição prevaleça. Mas haverá outras dúvidas. No caso de eleições indiretas, quem pode ser candidato? Vale, para quem ocupa cargo público, a regra de desincompatibilização das diretas? O voto dos parlamentares será secreto? E por aí afora.

Para complicar o quadro, tramita ainda a proposta de emenda do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que prevê a mudança das regras sucessórias no meio do mandato, com a realização de eleições diretas. Esperança da oposição, em especial do PT que aposta na candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela ainda está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e levaria pelo menos quatro meses até ser votada – bem mais que o tempo que Maia teria para convocar as eleições.

Quem ler os jornais nos próximos dias será apresentado a uma míriade de nomes de possíveis candidatos. Estão lá o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o ex-ministro Nelson Jobim e até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Por enquanto, tudo balão de ensaio. A disputa começa para valer se – e quando – Temer cair.

A frágil estratégia de sobrevivência dele está apoiada em dois pilares. Primeiro, tentar desqualificar as acusações da PGR como uma “armação”. Seu método é tentar desviar a discussão. É preciso tirar a atenção das malas de dinheiro carregadas por aliados e dos acordos firmados em salas fechadas tarde da noite para o universo da engenharia acústica. Quando a discussão na imprensa se ativer aos laudos sobre a gravação de Joesley, melhor para Temer.

O segundo pilar é tentar, de modo mínimo, fazer as reformas trabalhista e previdenciária avançarem no Congresso. Esse é o ponto mais frágil. Não há consenso algum sobre a Previdência. As negociações se arrastavam na Câmara, sem que o governo tivesse garantia de vitória. O próprio Meirelles reconheceu, num eufemismo, um atraso de “semanas”.

No Senado, Temer tem um pouco mais de chance de avançar com a reforma trabalhista – embora o bate-boca de ontem mostre como será difícil. Mesmo que consiga, nenhuma estratégia se sustenta com apenas dois pontos de apoio, um deles fragílimo. A queda é questão de tempo.

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